sexta-feira, 26 de julho de 2013

Thomas Mann contra Hitler - a queda do Fascismo







Thomas Mann


Discursos contra Hitler


BBC


27 de julho de 1943

Ouvintes alemães!

 O fascismo italiano está morto. Faz tempo que ninguém dá nada por ele – lá na sua terra ele sempre foi apenas tolerado, mas quando fez sua aliança com Hitler e a guerra sórdida contra a França, quando rebaixou este país à condição de província nazista, quando o sangue italiano correu aos borbotões na Rússia, as derrotas vieram e o império foi para o inferno, então o desprezo da juventude, da intelectualidade e de todo o povo não teve mais limites. A invasão da Sicília e o bombardeio de Roma lhe deram o golpe final. O líder e seu bando estão na cadeia, também aquele senhor Scorza, o cabeça dos esquadristas (*) com a garrafa de óleo de rícino, um dos piores torturadores e criminosos, que, no último minuto, se tornou repentinamente lírico e prometeu aos ouvintes salvar a gloriosa e sagrada Itália, obra-prima de Deus – quando se tratava, na verdade, de salvar unicamente a sua própria pele.

Não demorará muito, alemães, e vocês também ouvirão essa cantilena” já escuto Goebbels e os seus falando sobre a eterna Alemanha com sua música, sua profundidade, seus lugares culturais sagrados, a eterna Alemanha pela qual todos vocês, membros do Partido ou não, logo, logo terão de se unir para salvar da pior crise de sua história. Só que ele não dirão a vocês que a única maneira de salvar sua terra é libertá-la de seus profanadores e destruidores. Esses canalhas do Estado que nada conheciam além de mentira, violência e crime, conduzindo assim seus países à beira do abismo, quando sua hora chega querem se esconder atrás do patriotismo natural dos povos, da tradição e das coisas sagradas, certamente dignas de defesa, mas que nada têm a ver com sua baixeza e que justamente através do seu domínio foram jogados na lama.


Alemães, o mundo tem esperança e reza para que vocês não sejam mais tolos que os italianos, cuja inteligência musical não suporta esses cantos de sereia desafinados, respondendo a eles com o grito ‘Alla porta!’. Esse é um povo político que percebe o momento em que um regime cada vez mais comprometido, que se tornou completamente inviável, deve ser jogado pela janela em vez de ser arrastado consigo até que tudo esteja perdido. Alemães, se vocês não acordarem para essa inteligente decisão política, se no último minuto vocês não tiverem coragem de se desembaraçar da corja que tanta vergonha causou a vocês e à humanidade, então tudo está perdido, a vida e a honra.


É chegada a hora da decisão. É muito pouco provável que a Itália continue a lutar ao lado da Alemanha de Hitler contra os povos livres. O povo já decidiu. Nas praças não se grita apenas ‘Abaixo o fascismo!’, mas também ‘Fora alemães!’ e ‘Paz!’. Se a Itália sair da guerra e se transformar em campo de operações dos Aliados, logo os déspotas de vocês terão perdido os Balcãs, a Turquia entrará para as Nações Unidas e, antes que vocês possam dar conta, a ‘Fortaleza Europa’ será apenas a ‘Fortaleza Alemanha’, cujas velhas cidades serão destruídas pelas bombas das esquadrilhas aliadas.


Ajam! Tomem consciência do que aconteceu! O fascismo foi destruído em sua terra natal. Acabou-se o domínio da careta queixuda, acabaram-se os excessos heroicos à Marinetti, as fanfarronices à d’Annunzio e todo o embuste do retrocesso que se porta como se fosse jovem e cheio de futuro. Assim, a ideologia nacional-socialista, essa variedade do fascismo, perderá o chão, ficará isolada e incapaz de prosseguir, incapaz de manter o povo alemão vivo e de guia-lo para o futuro. Vocês não se gabaram de ser um povo da vida, de serem conhecedores da força motriz da vida? O nacional-socialismo está tão morto quanto o fascismo. Ele será enterrado profundamente e também profundamente esquecido.” [pp. 145-147]


(*) Milícia fascista italiana comandada por Carlos Scorza. Nos últimos anos da guerra, Scorza foi secretário do Partido Nacional Fascista. Após o conflito, fugiu para a Argentina, voltando à Itália em 1969. Morreu em um povoado próximo de Florença em 1988. (N.T.)




Fonte: MANN, Thomas. Ouvintes alemães!: discursos contra Hitler (1940-1945). (Deutsche hörer!) Trad. Antonio Carlos dos Santos e Renato Zwick. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009. 

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segunda-feira, 22 de julho de 2013

Mudanças do Governo na Itália - Mussolini detido






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Itália em julho de 1943


A destituição e prisão de Mussolini


“Mas o infortúnio militar [das forças italianas] não cessou. Em 15 de fevereiro de 1942, milhares de soldados italianos foram enviados à frente oriental para colaborar com os alemães. Eles sofreram as consequências de seu equipamento inadequado para suportar as terríveis condições do front russo. A série de fracassos, que culminou com o desastre da guerra no deserto [após a vitória Aliada em El Alamein], derrubou o moral de Mussolini no final de 1942, a ponto de ele enviar Ciano em seu lugar para encontrar-se duas vezes com Hitler e ficar 18 meses sem se dirigir ao povo italiano, em contraste com sua até habitual loquacidade.


Em 7 de abril de 1943, pouco depois da derrota em Stalingrado (2 de fevereiro de 1943), na qual milhares de soldados italianos foram mortos ou feitos prisioneiros, Mussolini reuniu-se com Hitler no palácio de Klessheim, em Salzburgo, e propôs a assinatura de um armistício com a União Soviética para que o Eixo pudesse concentrar todas as suas forças em outras frentes. O ditador alemão rejeitou a proposta completamente. Em 9 de julho de 1943, as tropas britânicas e norte-americanas desembarcaram na Sicília. A iminência da derrota derrubou o moral do Partido Nacional Fascista e o prestígio de Mussolini. No dia 16, Dino Grandi, presidente da Camera dei Fasci e dele Corporazioni, o Parlamento da Itália fascista, e um grupo de líderes do partido solicitaram a convocação do Grande Conselho do Fascismo, que não havia se reunido uma única vez nos últimos quatro anos. Três dias depois, Mussolini e Hitler encontraram-se na cidade de Feltre, no noroeste da região de Vêneto, enquanto os Aliados bombardeavam Roma. O Grande Conselho do Fascismo reuniu-se em 24 de julho e considerou ser necessário que Mussolini renunciasse a todos os seus cargos. O conselho era de natureza apenas consultiva e não tinha capacidade de destituir o Duce, que fora nomeado pelo rei. Mas o destino de Mussolini e de seu partido estava selado.


O Duce solicitou um encontro com o rei Vítor Emanuel III, que o recebeu durante vinte minutos. O rei, que tinha sido um de seus admiradores entusiásticos, comunicou-lhe que ele se tornara um obstáculo para a reorganização interna e para uma nova postura diante da guerra. Mussolini não aceitou esses argumentos, e o rei respondeu que tinha decidido substituí-lo pelo general Badoglio. Acrescentou que não havia motivos para Mussolini preocupar-se, porque sua integridade seria garantida. Mussolini protestou e deixou a sala, sem que o rei fizesse caso.


A prisão inesperada


Mussolini surpreendeu-se, pois seu carro tinha desaparecido e, em seu lugar, havia uma ambulância da Cruz Vermelha. Tudo fora cuidadosamente preparado: 200 carabinieri (membros da força policial italiana) ocuparam o palácio e um oficial obrigou-o a entrar na ambulância, acompanhando-o com outros quatro homens até um quartel. Ali, Mussolini permaneceu por uma hora, até ser transferido para outro, onde ficou detido sob a guarda de sentinelas.


Na terça-feira, 27 de julho, ele foi levado para a fortaleza de Gaeta, de onde foi conduzido pelo general Polito para a pequena ilha de Ventotene. Nesse local, ficou sob a vigilância de 50 policiais e outros tantos carabinieri. No dia 29, foi levado em um contratorpedeiro para a ilha de Maddalena. Depois de um mês, um hidroavião da Cruz Vermelha conduziu-o até o lago Bracciano, de onde foi levado por uma ambulância para o monte Gran Sasso, onde foi acomodado em um pequeno hotel para esquiadores, rigorosamente vigiado.


[...]
O poder organizado por Mussolini ruiu, mas sua história pessoal ainda não tinha chegado ao fim.” [pp.28-30]


Fonte: Coleção 70º aniversário da 2ª guerra Mundial, v. 19. 1943 – Hora da Virada: Aliados desembarcam na Itália . Trad. Fernanda Teixeira Ribeiro e Mario Miguel Fernandez Escalera. São Paulo: Abril Coleções, 2009.






segunda-feira, 15 de julho de 2013

Avanço aliado na Sicília - julho 1943







1943 - Avanço aliado na Sicília


Capítulo XX – A invasão da Itália pelos Aliados


Quando a posição germano-italiana na Tunísia caiu, em maio de 1943, os Aliados foram blindados com uma oportunidade maravilhosa. Oito divisões, juntamente com grande número de tropas auxiliares, foram cercadas e feitas prisioneiras nessa derrota. Compreendiam o grosso das tropas alemãs no teatro de operações do Mediterrâneo, e a melhor parte das divisões italianas. A península itálica agora estava aberta para o ataque, sem defensores. O moral italiano afundou a um nível ainda mais baixo. Havia apenas algumas poucas tropas alemãs, imediatamente disponíveis para reforçar a defesa da Itália – duas divisões no continente, uma que estava sendo instruída na Sicília, com recompletamentos que tinham sido mandados para lá, e outra do mesmo tipo, na Sardenha.

Passaram-se dois meses, contudo, sem que os Aliados dessem prosseguimento à vitória na Tunísia com o desembarque na Sicília, que teve lugar a 10 de julho. Mesmo assim, só havia duas divisões alemãs em cena para fazer face ao assalto inicial de oito divisões aliadas. Quanto aos italianos, quase todos entraram em colapso assim que os Aliados desembarcaram. Mas os alemães, embora sem apoio aéreo e sendo reforçados somente por mais duas divisões, conseguiram resistir aos exércitos invasores. E, após retardar a conquista da Sicília pelos Aliados até meados de agosto, fugiram através do estreito de Messina, sob densa proteção da artilharia antiaérea, para o território continental italiano. O marechal-de-campo Kesselring, comandante-em-chefe alemão no Sul da Itália, só teve que sentir-se grato pelo tempo que ganharam para ele. Mas também sentiu-se aliviado quando viu as duas divisões da Sicília em segurança, pois temia que seu oponente fizesse outro desembarque na ponta da bota da Calábria, bloqueando assim a retirada delas enquanto ainda estavam engajadas na Sicília.” p. 283


A invasão aliada do norte da África francesa, em novembro de 1942, sobreveio como uma surpresa completa para Hitler e seus assessores militares no O.K.W. (Tanto Keitel quanto Jodl admitiram, após a guerra, que não esperavam aquilo.) Embora tenham recebido informações sobre planos americanos para um possível desembarque em Dacar, e também nas ilhas do litoral oeste da África, imaginaram que os americanos não entrariam no Mediterrâneo propriamente dito por causa dos interesses britânicos ali! Quando a imensa frota de navios-transporte foi vista na costa do Marrocos, imaginaram que estivessem levando tropas britânicas para o Extremo-Oriente. Mesmo quando parte da frota passou pelo estreito de Gibraltar, concluíram que era um indício de um desembarque aliado na Líbia, imediatamente à retaguarda do exército de Rommel, recém-expulso do Egito por Montgomery.


Kesselring viu as coisas diferentemente. Sendo comandante-em-chefe das forças no Mediterrâneo central, estava melhor colocado para interpretar os indícios. Durante um ou dois meses, mostrou-se apreensivo, receando um desembarque aliado no norte da África francesa. Apenas três dias antes desse desembarque acontecer, a advertência de Kesselring de que ele era iminente provocou a descrença de sempre nos altos escalões, e seu apelo urgente por reforços foi desconsiderado. Não houve tempo perdido, contudo, para reagir à emergência. Tropas alemãs foram mandadas por via aérea para a Tunísia em pequenas quantidades, mas continuamente, o bastante para conter o avanço inicial aliado de Argel para Bizerta – embora fosse praticamente certo que não teriam êxito caso a operação por terra firme dos Aliados não tivesse começado de um ponto tão a oeste.” pp. 287-88


A conquista da Tunísia pelos Aliados abriu caminho para a invasão do sul da Europa, nos dois sentidos. Isto porque o cerco ao exército germano-italiano na Tunísia deixou a Itália e as ilhas italianas quase privadas de forças defensivas eficientes. No entanto, quando Hitler mandou uma mensagem a Mussolini oferecendo-se para enviar 5 divisões descansadas e bem armadas em seu auxílio, Mussolini respondeu que só queria 3. Sua resposta foi dada sem consultar Kesselring, o qual, quando soube dela, considerou-a como demonstração política do desejo italiano de ‘continuar dono da própria casa’. A resposta de Mussolini também contrariou a opinião do comandante do seu próprio exército, o general Roatta, que insistira na necessidade de obter seis divisões Panzer para serem distribuídas em três grupos – perto de Livorno, ao norte, em Roma, ao centro, e em Nápoles, ao sul. A redução do reforço oferecido custaria caro os defensores da Itália.” pp. 289-90


Dois meses se passaram antes que os Aliados desembarcassem na Sicília, e é notável que tão pouco tenha sido feito para reforçar a defesa daquela porta de entrada da Europa. Isto parece mais estranho ainda porque, durante o mês que se seguiu à queda de Túnis, as forças aéreas aliadas concentraram seus esforços para obter, através de bombardeios continuados, a rendição da ilha fortificada de Pantelleria, no canal entre a África e a Sicília. Esta grande ‘preparação’, a um alto custo de ‘munição’, foi extremamente efetiva para eliminar quaisquer dúvidas de que o objetivo seguinte dos Aliados seria a Sicília. No entanto, no alto comando inimigo não tirou proveito desse aviso, mesmo que o tivesse reconhecido como tal. Isso deveu-se, em grande parte, ao ciúme e à desconfiança existentes entre os chefes. [...]” p. 291


O alto comando aliado evitou escolher trechos da costa que se prestassem de modo especial aos blindados; em vez disso, misturou as unidades de carros de combate com todas as ouras forças de desembarque. Suponho que procurou não concentrar os blindados nas planícies por duas razões: primeiro, a supremacia dos Aliados no ar e no mar, o que os capacitava a desembarcar praticamente em toda a parte – pulverizando assim as forças da defesa – e que também evitava quaisquer encontros nas fases iniciais com forças blindadas inimigas. Uma segunda razão é que aquelas planícies à retaguarda de Gela e Catânia não proporcionavam terreno tão adequado para rápido avanço de blindados quanto as imensas planícies africanas.” p.292



A Itália muda de lado – e o contragolpe alemão


Quando Mussolini foi deposto, a 25 de julho, Hitler ficou alarmado, interpretando o acontecido como um sinal de que o novo governo italiano do marechal Badoglio, a despeito das afirmativas de permanecer integrando o Eixo, estaria procurando um modo de sair da guerra. A reação de Hitler foi rápida. No dia 27, ordenou ao Quartel-General do Grupo de Exércitos B de Rommel, que, naquele momento, estava assumindo o comando da Grécia, que ficasse com a responsabilidade de defesa do norte da Itália – com o pretexto de liberar as forças italianas para serem utilizadas em reforço ao sul do país, mais diretamente ameaçado. O Grupo B ficaria com a região ao norte da linha Elba-Ancona. Para completar o quadro, foram retiradas divisões alemãs dos outros fronts e mandadas apressadamente de trem para o norte da Itália.” p. 295

Em contraste com a visão de Hitler e do O.K.W., Kesselring persistiu na crença de que os líderes italianos permaneceriam leais à aliança com a Alemanha. Deplorou a ‘atitude extremamente fria do governo alemão para com Badoglio’, receando que aquela atitude pudesse levar o italiano ao rompimento, e estava particularmente ansioso para que os alemães não viessem a ser responsáveis por uma coisa dessas. Quando recebeu ordens, no início de agosto, para ficar em condições de desarmar e prender todas as forças italianas, se o governo de Badoglio capitulasse, ponderou que isso estaria além de suas limitadas forças. À luz de qualquer avaliação de efetivos, espaço e risco de intervenção aliada, sua ponderação parecia bem justificada. Como não conseguiu alterar a ordem, Kesselring decidiu restringir-se ao que lhe parecia viável.” p. 296


[O comandante supremo aliado] Eisenhower fez uma observação adequada: ‘Os italianos desejavam freneticamente render-se’. Mas a consumação do desejo deles foi lamentavelmente retardada, em parte por causa da deficiência das negociações, e em parte por causa do efeito dissuasor da fórmula de ‘rendição incondicional’ dos Aliados. O processo todo tomou mais tempo que convinha a ambos os lados. O armistício acabou sendo assinado a 3 de setembro, o dia em que Montgomery atravessou o estreito de Messina e desembarcou na ponta da Itália. deveria ser mantido em segredo até que os Aliados efetuassem um segundo desembarque, desta vez na canela da bota, tendo sido escolhido o golfo de Salerno. A ideia era lançar simultaneamente uma divisão paraquedista perto de Roma, para ajudar as divisões italianas. Mas esta parte do plano abortou. O desembarque de Salerno começou à meia-noite de 8 de setembro, precedido em algumas horas pelo anúncio da capitulação da Itália, coisa que os líderes italianos não esperavam senão para alguns dias mais tarde. Foram surpreendidos sem que estivessem preparados para cooperar, reclamando que seus preparativos ainda não haviam terminado, e o lançamento dos paraquedistas foi cancelado. Embora a surpresa dos alemães fosse ainda maior, sua ação em Roma foi rápida e decisiva, a despeito da emergência simultânea em Messina. Como o mais profundo desejo dos italianos era cessar a luta, renderam-se aos alemães, na ausência dos Aliados!” p. 297

Fonte: HART, Liddell. O outro lado da colina. (The other side of the hill, 1948) trad. Luiz Paulo Macedo Carvalho e Haroldo Carvalho Neto. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1980.



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Patton / 1970







segunda-feira, 8 de julho de 2013

Batalha de Kursk 2 - julho 1943





A Batalha de Kursk


julho 1943



Tropas eslavas agregadas às tropas alemãs


A propaganda alemã retratava [o general Andrei] Vlasov como o líder do Exército Russo de Libertação (Russkaia Osvoboditelnaia Armiia, ROA). Um exército que, na realidade, não existia. As várias formações de voluntários recrutados na URSS foram organizadas com a autonomia de um batalhão ou companhia e dependiam de comandantes alemães. Nem todas eram russas: muitas eram formadas por voluntários de outras nacionalidades.


Em qualquer caso, as unidades de tropas do leste eram significativamente numerosas. Para enquadrá-las e dirigi-las, os vários grupos de exércitos alemães criaram a figura de comandos de tropas orientais. Começaram a ser instituídos no final de 1942 e meados de 1943. o Grupo de Exércitos Central contava com seis deles, o do Sul com cinco e o do Norte com três. À frente de cada um desses comandos, estava um Generalmajor, posto que, geralmente, era ocupado por um comandante de divisão alemã. Em praticamente toda sua totalidade, essas forças eram usadas contra os guerrilheiros [comunistas e nacionalistas].


Quando [o ditador Adolf] Hitler foi informado sobre as atividades de Vlasov, ordenou sua interrupção e que Vlasov retornasse ao campo de prisioneiros. Mas, alertado sobre a conveniência de continuar a usar o militar russo como um trunfo publicitário, ele concordou, a contragosto, com a situação. Na verdade, os patrocinadores alemães de Vlasov estavam preparando um golpe de efeito: uma ambiciosa operação propagandística previsto para começar no mesmo dia em que a operação Cidadela fosse lançada – originalmente programada para 5 de maio de 1943. A ação propagandística foi batizada como Silberstreif [operação para incentivar a deserção de tropas inimigas]. Foi realizada a partir dessa data durante vários dias e envolveu o lançamento de vários milhões de panfletos sobre as linhas e a retaguarda soviética, convidando os soldados e civis soviéticos a juntarem-se ao Exército Russo de Libertação. O impacto teria sido maior se, simultaneamente, a máquina de guerra alemã tivesse obtido sucessos retumbantes. Não foi o caso: a operação Cidadela foi adiada. Ainda assim, durante várias semanas, verificou-se um aumento no número de deserções nas fileiras do Exército russo.” (p. 60)


mais info sobre Andrei Vlasov



Stalin incentiva o nacionalismo na Guerra Patriótica


Enquanto o racismo e o imperialismo levaram Hitler à cegueira completa, Stalin agiu de forma totalmente oposta. Já em 1941, havia chamado a guerra contra a Alemanha como a Grande Guerra Patriótica, em vez de pedir a seu povo que lutasse em defesa do regime comunista. Em 1942, introduziu novas condecorações para seus soldados, que, além das de fundo comunista, como a Ordem da Bandeira Vermelha ou a de Lenin, passaram a receber as ordens de Alexander Nevski (príncipe russo e santo da igreja ortodoxa do século 13), de Alexander Suvorov (general russo do século 18) ou de Mikhail Kutuzov (general russo dos séculos 18 e 19 e que salvou a Rússia de Napoleão), criados para homenagear heróis nacionais do passado czarista russo. Em 1943, foi feita uma mudança espetacular no uniforme do Exército Vermelho: reapareceram, em todo o seu esplendor, as vistosas ombreiras que, no Exército czarista, haviam sido usadas para identificar as fileiras militares. Os bolcheviques consideravam-nas o mais odioso símbolo do czarismo. […]

Essa não foi a única novidade em 1943. o odiado Corpo de Comissários políticos desapareceu como tal no Exército Vermelho. Seus membros foram rebaixados ao papel de meros conselheiros sobre questões de propaganda. A Internacional deixou de ser o hino oficial da união Soviética e foi substituída por um novo hino nacional. A Internacional Comunista foi oficialmente dissolvida. Stalin chegou a permitir que a Igreja ortodoxa Russa elegesse um novo patriarca. Em suma, enquanto Hitler renunciava completamente à chance de usar o trunfo do patriotismo russo anticomunista a seu favor, Stalin estimulava, cada vez mais, esse mesmo patriotismo para reforçar a capacidade de luta de seus homens, enquanto parecia descaracterizar os sinais de identidade comunista na URSS.” (pp. 67b e 69)

Adiamentos da Operação Cidadela
Concentração de Tanques e outros blindados

A soma dos tanques enquadrados nas unidades designadas aos Grupos de Exércitos Central e do Norte para o ataque, além das duas divisões Panzers e uma de granadeiros blindados do 1º Exército Panzer, alcançava 2.272 máquinas. Vários modelos completamente obsoletos continuavam em operação, incluindo alguns Panzers II, mas, sobretudo, Panzers III e IV, com canhões curtos: cerca de 13% do total. A maioria dos tanques que seriam usados em Kursk, 64%, pertencia aos modelos Panzer III e IV, equipados com novos canhões. Os modelos realmente novos, os Panzers V, Panther e Panzer VI Tiger, somavam apenas 15%. os 8% restantes dividiam-se entre tanques de comando, que não eram equipados com canhões e cuja missão era conduzir o combate como postos de comando móveis, alguns tanques lança-chamas e outros tanques russos T-34 capturados como despojo de guerra.

Os tanques da primeira categoria citada não podiam enfrentar os tanques soviéticos do modelo mais comumente usado, o T-34. Os da segunda categoria podiam fazê-lo de forma adequada, mas apenas os novos Panthers e Tigers eram realmente superiores ao T-34. Embora os Panthers e Tigers correspondessem a apenas 15% da força de ataque, toda a esperança de ataque foi depositada em sua superioridade qualitativa. Os sucessivos adiamentos do ataque a Kursk ocorreram justamente porque os alemães buscavam reunir um número suficiente de tanques. A ofensiva, prevista para 4 de maio, foi adiada para 12 de junho, depois para o dia 20 do mesmo mês, em seguida para 3 de julho e, por fim, foi lançada no dia 5 de julho.” (p. 76 e 78)


Artilharia e Aviação


Os tanques não podem combater sozinhos, é claro. Embora a infantaria reunida para apoiá-los sempre fosse relativamente fraca, uma impressionante massa de unidades de artilharia foi reunida para a operação Cidadela. Os efetivos de canhões próprios de cada divisão foram complementados com grupos independentes de obuses pesados, canhões antiaéreos e os temíveis lança-foguetes alemães, muito menos famosos do que os soviéticos [os Katyuscha, ou órgãos de Stalin] , mas muito mais eficazes. Para possibilitar o movimento das pontas de lança blindadas, elas foram reforçadas com batalhões de sapadores com a finalidade de limpar campos de minas e construir pontes.


Embora a Batalha de Kursk seja geralmente descrita como um grande confronto terrestre, a Luftwaffe e a Força Aérea soviética travaram uma batalha não menos titânica no ar. Ao contrário do Exército terrestre alemão, que concentrara quase toda a sua força militar na frente oriental, a Luftwaffe mantinha uma elevada proporção de seus efetivos no Mediterrâneo e no oeste, para conter a ofensiva aérea sobre a Alemanha. Ainda assim, para a operação Cidadela, seriam concentrados no setor de ataque 42 % dos efetivos de aeronaves de combate de toda a Luftwaffe, com a 4ª Frota Aérea apoiando as ações do Grupo de Exércitos do Sul e a 6ª Frota apoiando o Grupo Central. A quantidade de 2,1 mil aparelhos reunidos torna-se mais impressionante se for levado em conta que a soma dos efetivos disponíveis em toda a frente oriental naquele momento era de 2,5 mil.

Na verdade, a Batalha de Kursk começou no céu antes do que no solo. Tanto a Luftwaffe como a Força Aérea soviética realizaram, durante as semanas precedentes, ataques de bombardeiros em profundidade sobre as retaguardas inimigas, para impedir a concentração de forças do adversário. A Luftwaffe realizou, inclusive, uma de suas raras campanhas estratégicas, tentando alcançar vários centros industriais russos para reduzir a produção de armamento pesado, com uma eficácia muito limitada.
Tanto soviéticos como alemães usavam sua aviação como força tática, em apoio às operações terrestres. [...]” (pp. 81-82)


Planos do Ataque alemão


À primeira vista, o plano de ataque alemão era surpreendentemente simples. A partir dos limites superior e inferior do saliente, duas massas atacantes romperiam as linhas inimigas para convergir no centro, ao redor da cidade de Kursk. O Grupo de Exércitos Central executaria sua parte por meio do 9º Exército, liderado por um general excepcionalmente qualificado: Walter Model. Além de seu talento militar, tinha a reputação de ser muito devotado a Hitler e, portanto, muito confiável. Sua situação estratégica era relativamente arriscada, pois o ponto de partida de sua ofensiva estava no chamado saliente de Orel, no qual as linhas alemãs adentravam em território russo, de modo que poderia ser vítima de uma contraofensiva sobre sua retaguarda a qualquer momento. Por essa razão, a ideia de manobra do marechal de campo Walter Model era romper as linhas usando basicamente suas divisões de infantaria, apoiadas por seus grupos de canhões de assalto. Depois de romper a frente, seria a hora de lançar, pela brecha, suas divisões Panzers.

A massa de ataque meridional seria comandada diretamente pelo marechal Erich von Manstein, comandante do Grupo de Exércitos do sul, com dois grandes grupamentos: o 4º Exército Panzer, do general Hermann Hoth, e o destacamento do Exército do general Werner Kempf (esses destacamentos do Exército eram unidades mais potentes do que um corpo de exército, mas menos do que um exército). Manstein pensava em usar duas pontas de lança divergentes: o 4º Exército Panzer atacaria diretamente para o norte e o Destacamento Kempf o faria para o nordeste, partindo de suas posições situadas, respectivamente, a oeste e a leste da cidade de Belgorod.” (pp. 83-85)


Mais info sobre von Manstein

sobre o general Model




Defesas soviéticas

As forças soviéticas presentes no saliente de Kursk já eram poderosas quando [o general Georgi] Zhukov propôs seu plano [de linhas defensivas], mas não deixaram de ser aumentadas, aproveitando-se, nesse caso, os sucessivos adiamentos do ataque alemão. Por fim, as frentes Central (comandada pelo marechal Konstantin Rokossovski) e de Voronezh (sob o comando do general Nikolai Vatutin) totalizavam cerca de 1,3 milhão de homens, armados com 3,6 mil tanques e canhões de assalto, 13 mil canhões e morteiros e 2,8 mil aviões de combate. Números que já eram superiores aos dos efetivos de que dispunham os alemães Manstein e Model (ao todo, 435 mil soldados, 10 mil canhões e morteiros, pouco menos de 3 mil tanques e canhões de assalto e 2,1 mil aeronaves). Mas o que era realmente grave para os alemães é que eles não conseguiram detectar a presença da Frente da Estepe, sob o comando do marechal Ivan Konev, que compreendia 450 mil soldados, 6,5 mil canhões e morteiros e 1,5 mil tanques e canhões de assalto. A superioridade soviética global era, portanto, de quatro para um em homens, dois para um em canhões e de 1,7 para um em tanques. Somente em aviões havia apenas uma relativa equivalência.” (p. 86B e 88)


mais info sobre generais russos


A superioridade soviética em infantaria era total. Para tirar o máximo proveito eram traçados até oito anéis sucessivos de fortificações. Os três primeiros eram guarnecidos pelas unidades soviéticas do nível de exército (cada frente contava com várias delas e, apesar do sugerido pelo nome, assemelhavam-se mais a um corpo de exército alemão) e encontravam-se muito próximos da linha de contato. Estavam totalmente equipados e guarnecidos. Mais para a retaguarda, as unidades do nível de frente controlavam outros três anéis de defesa, que, apenas em parte, estavam guarnecidos, mas já tinham construído suas trincheiras, bunkers etc. Um sétimo anel situava-se já fora do saliente de Kursk, e o oitavo havia sido estabelecido mais ao leste, nas margens do Don. Estavam preparados para receber sua guarnição, mas ainda não estavam ocupados.” (p. 88b)

Embora a Batalha de Kursk tenha entrado para a história por seus espetaculares combates entre tanques, a verdade é que o avanço alemão foi consumido principalmente no labirinto de campos minados, trincheiras armadas com metralhadoras e morteiros, posicionamentos maciços de canhões antitanque e campos de tiro perfeitamente cobertos por todos os tipos de canhão e lança-foguetes. Os Panzers que, por fim, conseguissem ultrapassá-los estariam em grande inferioridade numérica diante dos tanques soviéticos.” p. 92b - 93a

Fonte: Coleção 70º aniversário da 2ª Guerra Mundial, v. 21. 1943 – Batalha de Kursk marca colapso do Nazismo. São Paulo: Abril Coleções, 2009. Trad. Fernanda Teixeira Ribeiro e Mario Miguel Fernandez Escaleira.


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(trecho de A Grande Batalha / 1969)






sexta-feira, 5 de julho de 2013

Preparação da Operação Husky - Sicília 1943





Preparação da Operação Husky


[Divergências entre os Aliados]


“As circunstâncias em que se faria a invasão da Sicília, operação aprovada pelos Chefes de Estado-Maior Combinados, na Conferência de Casablanca [em janeiro 1943], provocaram discussão quase interminável. Messina, situada no ângulo nordeste da ilha e a apenas alguns quilômetros da Itália continental, era o objetivo estratégico óbvio, pois uma vez tomada, os soldados alemães e italianos que estivessem na ilha não poderiam escapar para a ponta da bota italiana.
Mas, Messina era bem fortificada. Aos pilotos aliados parecia dotada de uma verdadeira muralha de fogo antiaéreo e de grande número de aviões interceptadores, baseados nos aeródromos próximos. Alcançar por mar, o estreito de Messina era também extremamente perigoso para as belonaves aliadas, devido aos numerosos canhões costeiros. Por último, não havia nas vizinhanças da cidade, ao que parecia, praias adequadas a desembarques anfíbios.
Os britânicos mostravam-se particularmente cautelosos sobre a invasão da Sicília. Seus estrategistas eram pela tomada prévia dos aeródromos e portos da ilha, sem o que, segundo eles, Messina poderia significar tragédia. O primeiro plano apresentado por Alexander, responsável pelas forças terrestres envolvidas na operação, previa três desembarques – um na parte sudeste da ilha, outro perto do extremo sudoeste dela e o terceiro, em algum local, a noroeste. Era um projeto complicado, sobretudo do ponto de vista logístico, porque envolvia três assaltos sucessivos, em lugar de três desembarques simultâneos. A dispersão dos efetivos aliados em três frentes tornaria cada uma delas bastante vulnerável.


Montgomery, que conduziria seu 8º Exército pela Sicília, protestou que as forças à disposição dos Aliados não eram suficientemente poderosas para tomar todos os objetivos estipulados no plano. Ele era por uma maior concentração de forças e pediu que uma divisão americana fosse anexada às tropas sob seu comando, o que redundava, forçosamente, na supressão do desembarque do sudoeste, perto de Gela.


Em oposição a Montgomery colocaram-se Cunningham e Tedder, que achavam que muitos desembarques estenderiam os defensores do Eixo. Os italianos, além de mal equipados, estavam de moral baixo, mas talvez lutassem com vigor para defender o solo italiano. Se os alemães entrassem na Sicília em grandes números, seria difícil derrotá-los.


Finalmente, oito planos foram elaborados para a invasão da ilha. Eisenhower, embora não fosse, especificamente, responsável pelo plano final aceito, visitou os Q-Gs subordinados – os de Alexander, Cunningham e Tedder – e, em conversas e sugestões, ajudou a desenvolver o conceito final. A tendência de Eisenhower era para, concordando com Montgomery, que se fizesse um assalto concentrado, tendo em vista que a medida reduziria os riscos inerentes a todos os assaltos anfíbios e permitiria às forças britânicas e americanas apoiarem-se mutuamente.” pp. 51-52


“A invasão da Sicília, de codinome 'Husky', foi o maior assalto anfíbio da História, em termos de volume de tropa terrestre empregada logo de início e em termos de frente. Sete divisões, além de partes de duas divisões aeroterrestres, desembarcariam ao longo de uma frente de 160 km de extensão.


Para estar o mais próximo do local da ação, Eisenhower foi para Malta, a 7 de julho, onde se localizava o posto de comando de Cunningham. No último minuto, o tempo mudou. Ventos fortes e grandes ondas desviavam aviões e navios do rumo certo, levando alguns subordinados de Eisenhower a pedir o adiamento da operação. Entretanto, o adiamento implicaria atraso de duas ou três semanas, tempo necessário a que as esquadras de invasão se reorganizassem. Eisenhower conferenciou com seus meteorologistas e, ao saber que o tempo melhoraria imediatamente antes do momento marcado para os desembarques, deu o sinal de partida. 'A operação prosseguirá de acordo com os planos', telegrafou Eisenhower a Marshall.


A despeito da prometida melhora, feita pelos meteorologistas, das condições do tempo, os ventos fortes, pondo em tumulto as águas do mar, não permitiram a ninguém, até o último instante da operação, um segundo de despreocupação. Todas as unidades tiveram dificuldades no desembarque. Mas elas conseguiram descer a terra com baixas relativamente leves. A razão disso foi a resistência errática e em geral ineficaz dos defensores italianos.


A luta subsequente seria mais difícil, pois os alemães reforçavam os italianos e tirariam o máximo proveito do terreno, lutando com garra. Eles resistiram aos Aliados por mais de um mês.


Na sua maior parte, a conquista da Sicília foi realizada pelos comandantes subordinados de Eisenhower. Alexander dirigiu as as forças de terra, Cunningham, as navais, e Tedder, a cobertura aérea. Até certo ponto, houve falta de coordenação entre as três armas, devida em grande parte à separação dos Q-Gs – Cunningham estava em Malta, Tedder na Tunísia e Alexander deslocara-se para a Sicília.


Mais negativo ainda foi o atrito havido entre os dois comandantes-de-exército que se encontravam na ilha. Patton comandava o 7º Exército americano e Montgomery o 8º britânico . Ainda condicionado pelo que vira do combatente americano no Passo de Kasserine, Alexander preparou a campanha para que Montgomery e os britânicos fizessem o esforço principal, relegando Patton e os americanos a missão puramente protetora, garantindo o flanco de Montgomery.


Os desembarques haviam sido feitos em torno da ponta sudeste da ilha. Os britânicos avançariam costa leste acima, desde Siracusa passando por Catânia em direção à Messina, enquanto os americanos, à esquerda, protegiam o movimento britânico.


Foi por isso que Patton, irritado, avançou vigorosamente para Palermo, carregando rápido para tomar Messina. Ele conseguiu vencer Montgomery, que fora retido em Catânia, na corrida para a cidade portuária, cuja captura marcou o fim da campanha.
No processo, as tropas de combate americanas recuperaram a confiança em sua eficiência e capacidade de enfrentar e vencer as forças alemãs.” [pp. 56-57; 59]


fonte: BLUMENSON, Martin. Eisenhower. Rio de Janeiro: Rennes, 1976. trad. Edmond Jorge.



[O cauteloso e vaidoso Montgomery]


“[...] o Comandante do Oitavo Exército [Montgomery] já havia deixado, em pensamento, a campanha da África, pois passara a concentrar-se na próxima fase das operações e no papel de grande importância que iria desempenhar na Sicília e, subsequentemente, na Itália. Embora já houvesse faltado a várias reuniões e conferências importantes, em que se ultimavam os detalhes da 'Operação Husky' – a campanha da Sicília – mandando sempre em seu lugar De Guingand, não deixava de criar problemas. Na opinião dos generais americanos, a objeção de Montgomery à referida operação prendia-se em essência à parte que teria de desempenhar no curso das mesmas. Obstinara-se em que as coisas teriam que ser feitas à sua maneira, de modo que o risco de derrota passasse a ser nenhum. Mas, acima de tudo, tinha ainda que ser convencido ou convencer-se a si mesmo, preliminarmente, de que todo o plano era concepção sua, como vinha fazendo desde Alamein e posteriormente faria, até o fim da guerra.


Com relação ao plano de campanha da Sicília, o que Montgomery desejava, acima de tudo, era reservar para si captura de Messina, trampolim para o assalto à península italiana e, no fim, acabou conseguindo quase tudo que pleiteara. O General Patton, que nada pedira para si, reservaria para o campo de batalha os comentários que se absteve de fazer; lá, seus feitos falariam por si mesmos. A Alexander, na qualidade de Comandante de Grupo de Exércitos, caberia, de novo, a tarefa de 'pastorear' o pretensioso Comandante do Oitavo Exército, ao longo de todo o caminho.
Como o tempo estivesse passando e os queixumes e os regateios de Montgomery começassem a irritar Alexander e Eisenhower, Churchill resolveu intervir e, agastado com as delongas, em sardônica nota enviada aos Chefes de Estado-Maior, assim se expressou: 'A 'Operação Husky' está sendo planejada na base de exigências excessivas. Deve-se fazer sentir aios Comandantes dos Exércitos a necessidade de darem uma contribuição pessoal à vitória, caso desejem fazer jus à glória. Tanto britânicos como norte-americanos estão sobrecarregando os planos da campanha com número tão elevado de fatores de segurança, que acabarão por se mostrarem incapazes de realizar qualquer tipo de guerra agressiva. É bom lembrar que durante os seis ou oito meses próximos, os exércitos da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos terão de enfrentar, quando muito, meia dúzia de divisões alemãs' (transcrito de The Hinge of Fate).


A nota do Primeiro-Ministro exprime claramente sua frustração e ansiedade ante a demora dos comandantes aliados em soltar as garras sobre o inimigo, na ocasião em que sabia estarem os russos combatendo contra cerca de 185 divisões alemãs.” [pp. 93 e 95]


Plano da Invasão


“A 13 de maio, o esboço final do plano foi aprovado pelos chefes Conjuntos de Estado-Maior. Previa oito desembarques simultâneos ao longo de cem milhas de costa, entre Siracusa, a leste, e Palma-Licata, a sudoeste. Dava ainda ao General Patton e ao Sétimo Exército o papel de 'segundo violino' na orquestra do 'maestro' Montgomery. Os dois exércitos – o Sétimo e o Oitavo – deveriam lutar em íntimo contato, 'cada um dependendo do outro, por força de problemas de apoio direto, no decorrer da campanha …'


As exigências feitas em relação à quantidade de homens e material considerados necessários à execução dos planos alarmaram Churchill. Três mil navios e embarcações de desembarque para o transporte de 160 mil homens, 14 mil veículos, 600 tanques e 1.800 canhões até as praias da Sicília, a fim de enfrentar quatro ou seis divisões inimigas! Além disso, 146 esquadrões americanos e 113 e meio esquadrões britânicos, num total de 4.900 aviões, seriam empregados em apoio e cobertura para as operações. Era prevista, ademais, a descida de duas divisões aerotransportadas. E, como preliminar para o assalto, as ilhas de Lampedusa e Pantelleria teriam que ser reduzidas a escombros, através de bombardeios de saturação.
Com tudo isto, pode-se afirmar que realmente se preparava enorme marreta para quebrar pequenina noz, exemplo único em toda a guerra, até aquela data, de emprego de tão fantástica quantidade de homens e materiais para assalto a uma pequena ilha do Mediterrâneo. A muitos pareceu que a arte de se fazer a guerra iria dali por diante escapar ao controle dos militares, ou, como bem assinalou o General Fuller, 'a era dos traficantes da guerra havia começado, sendo Montgomery o seu sumo sacerdote'.
A 19 de junho,  em  cerimônia  pública  confirmando  a  honraria  já  concedida,  o  General Montgomery foi sagrado Cavaleiro, pelo Rei Jorge VI.” [p.96]

Fonte: THOMPSON, R. W. Montgomery. Rio de Janeiro: Rennes, 1976. trad. Prof. Alcídio M. De Souza



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Patton / 1970

segunda-feira, 1 de julho de 2013

A Batalha de Kursk - julho 1943 / 1





A Batalha de Kursk
Julho de 1943


Após sua vitória em Stalingrado, o Stavka (Alto-Comando do Exército Vermelho) preparou uma grande ofensiva para expulsar os alemães do sul da Ucrânia e isolar o Grupo de Exércitos A alemão, localizado no Cáucaso. Os alemães evitaram a manobra graças a uma retirada rápida, que amontoou um grande número de efetivos na ponte do rio Kuban. Hitler ordenou então uma grande contraofensiva, que encontrou a obstinada resistência dos russos, que haviam tomado Kharkov e se aproximado de Zaporozhie, o quartel-general de Erich von Manstein. Esse mesmo general conduziu outra contraofensiva, que recuperou Kharkov e fez o Exército Vermelho recuar até um saliente em torno de Kursk.” (p. 26)


Mais info sobre von Manstein


Contra-ataque em Kharkov




A Batalha de Kursk que se seguiria, entre 5 e 13 de julho de 1943, seria a maior operação de envolvimento militar da história, cercando aproximadamente 2 milhões de soldados. Seria decidida por um confronto entre os tanques, ocasião em que o T-34 consolidou sua fama. Como consequência da derrota alemã, a iniciativa estratégica passaria definitivamente para os russos, cuja superioridade já era enorme.” (p. 26b)


Uma batalha decisiva para o rumo da guerra

[...] A batalha travada em Kursk durou poucos dias e desenrolou-se em um cenário relativamente pequeno em relação à gigantesca escala geográfica das batalhas travadas na frente oriental. Na análise da batalha em si, excluindo-se os acontecimentos que a precederam e suas consequências, conclui-se que a Batalha de Kursk terminou sem vitoriosos, de forma que não se pode identificar claramente o vencedor e o perdedor.


A Batalha de Moscou teve elementos muito mais dramáticos. Tudo contribuiu para caracterizar a pesada carga de tensão dessa batalha: os alemães aproximando-se da capital, a ponto de vislumbrar as torres do Kremlin; a contraofensiva lançada no último momento pelo Exército Vermelho; o rigoroso inverno em que ocorreram os combates.” (p. 31)


Tem-se repetido regularmente que Kursk foi a maior batalha de tanques da história. Embora alguns autores tenham questionado tal afirmação, não há dúvida de que essa localidade foi palco de um gigantesco choque entre forças blindadas. Mas foi muito mais do que isso. Na Batalha de Kursk, a Wehrmacht, as Forças Armadas alemãs, empregou um poder militar nunca antes dedicado a um espaço tão pequeno. Usou seus melhores combatentes: os melhores generais e também os melhores soldados. Colocou em jogo suas armas mais sofisticadas. E, até então, nada nem ninguém havia conseguido deter a Wehrmacht, que se lançou em combate aproveitando as condições climáticas adequadas do verão.” (p. 32)


Nessa ocasião, no verão de 1943, depois de concentrar sua capacidade ofensiva ao máximo, os alemães partiram novamente para o ataque, sobre um setor relativamente menor. Mas, mesmo assim, conseguiram avançar apenas alguns quilômetros na área coberta pelos destacamentos soviéticos. Além disso, depois de serem detidos de forma eficaz, os alemães descobriram que, já que não conseguiam mais avançar, era o Exército Vermelho quem passava para a contraofensiva, sobre uma frente muito ampla, de forma a obrigá-los a recuar centenas de quilômetros. A guerra tinha definitivamente mudado de rumo.” (pp. 33-34)


A maior parte do poder militar alemão estava concentrada na frente oriental, da seguinte maneira: o Grupo de Exércitos do Norte contava com 33 divisões de infantaria (uma delas era a Divisão Azul espanhola), 10 divisões de infantaria leve, 1 de treinamento de recrutas e 3 de segurança, para lutar contra os guerrilheiros. No outro extremo da frente, o Grupo de Exércitos A, que controlava as tropas posicionadas na cabeça de ponte de Kuban e na península da Crimeia, contava com uma divisão Panzer, oito de infantaria, quatro de infantaria leve e uma de treinamento de recrutas, além de tropas romenas.


Os alemães tinham concentrado suas forças nos Grupos de Exércitos Central e do Sul, que deveriam realizar o ataque contra Kursk. Os números falam por si quando comparados aos demais efetivos destinados aos outros setores. O Grupo Central alinhava oito divisões Panzer, 3 de granadeiros blindados, 60 divisões de infantaria, 4 de infantaria leve, 4 de segurança e 2 de instrução, bem como algumas tropas húngaras. O Grupo Sul contava com 12 divisões Panzers, 1 de granadeiros blindados, 27 de infantaria, 2 de infantaria leve, 3 de segurança e algumas forças romenas.


A Europa ocupada pela Alemanha ficou praticamente desguarnecida, tanto no oeste como no sul, e as tropas foram concentradas na frente oriental. Mas foram os Grupos de Exércitos Central e do Sul que haviam sido reforçados ao máximo, tanto com forças de infantaria quanto, sobretudo, com tropas blindadas: divisões Panzers e de granadeiros blindados. Os dois grupos de exércitos compreendiam 20 das 25 divisões Panzers em situação de operatividade. O Grupo de Exércitos Central, sozinho, tinha duas vezes mais divisões de infantaria do que a soma de todas as divisões presentes na Europa ocidental, Itália e Balcãs.


Essa concentração de poder de fogo tinha um objetivo: no verão de 1943, o Exército alemão voltaria a lançar um ataque na frente oriental. O desastre de Stalingrado e a rendição das tropas ítalo-germânicas na Tunísia evocavam o fantasma da derrota. O moral da população alemã sofreu severamente. O Eixo cambaleava e todos os aliados do Terceiro Reich procuravam uma maneira de sair da guerra. Era necessário efetuar uma manobra de grande efeito, que mostrasse que a Wehrmacht estava longe de ser derrotada ou, até mesmo, que pudesse vislumbrar alguma esperança de uma vitória final. Por sua vez, ao lado dos Aliados e, especialmente, nas fileiras soviéticas, o moral da luta cresceu consideravelmente e já se contemplava a possibilidade de uma vitória final. [...]” (pp. 43-44)


Zeitzler [general Kurt, chefe do Estado-Maior do Exército da Alemanha] identificou inclusive o local onde lançar essa ofensiva: o chamado ‘saliente de Kursk’. Como consequência da ousada ofensiva do marechal Erich von Manstein em fevereiro-março de 1943 [em Kharkov], os soviéticos tiveram de abandonar uma parte do território conquistado, surgindo assim esse saliente. Tinha uma forma retangular, de cerca de 200 quilômetros de norte a sul e 70 quilômetros de leste a oeste. Aniquilá-lo parecia muito simples para o Exército alemão, que, em 1941, atacara em uma frente de vários milhares de quilômetros e, em 1942, embora tivesse atacado em um setor muito mais estreito, tinha sido capaz de chegar até o Cáucaso. A conquista de Kursk e de seu saliente seria uma punição severa para a capacidade ofensiva do Exército Vermelho, em função da importância das tropas inimigas ali posicionadas. Além disso, Stalin suspeitaria que, novamente, os alemães empreenderiam uma ofensiva em direção a Moscou, pois, de fato, Kursk parecia um excelente trampolim para atacar a capital a partir do sul.


Na verdade, essa última possibilidade nunca foi seriamente considerada, já que os alemães não sabiam a situação em que suas forças se encontravam. Mas seria o suficiente se os soviéticos acreditassem nessa possibilidade e abandonassem seus próprios projetos em outros setores de ataque. Zeitzler chegou a dar um nome a seu plano: operação Zitadelle (Cidadela).


A análise de Zeitzler, finalmente, convenceu Hitler, embora, na realidade, o Führer tivesse mostrado pouco entusiasmo pela operação. Ele estava aterrorizado com a possibilidade de fracasso, o que seria um sinal claro da ruína da Alemanha. Assim, a operação, que em sua concepção original deveria ter sido lançada no início de maio, foi adiada semana após semana, com o objetivo de concentrar forças e, por fim, seria lançada somente no início de julho.” pp. 48-49)




Fonte: Coleção 70º aniversário da 2ª Guerra Mundial, v. 21. 1943 – Batalha de Kursk marca colapso do Nazismo. São Paulo: Abril Coleções, 2009. Trad. Fernanda Teixeira Ribeiro e Mario Miguel Fernandez Escaleira.


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