segunda-feira, 3 de junho de 2013

FEB - Força Expedicionária Brasileira - preâmbulos






Força Expedicionária Brasileira

1943-1945


O ano de 1943 marcou a reviravolta na Segunda Guerra Mundial, com as derrotas do Eixo, e a entrada de esforços brasileiros no conflito, com mobilização popular e a preparação de uma força expedicionária. Para mais detalhes destas reviravoltas veremos alguns trechos de uma obra escrita por uma testemunha presente aos acontecimentos históricos, um líder antifascista que trabalhou para mobilizar esforços contra a expansão do nazi-fascismo.



Fonte: FALCÃO, João. O Brasil e a 2ª Guerra. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999.


Capítulo IX - Mobilização econômica

Sério problema decorrente da entrada do Brasil na guerra foi a mobilização econômica, que não cabia nos quadros de uma administração pública primária e limitada, como era a do estado ditatorial existente. As questões de abastecimento e fornecimento de matérias-primas e manufaturadas aos aliados, principalmente aos Estados Unidos, o problema do transporte interno e para fora do país, além de tantos outros, levaram o presidente da República a criar a Comissão de Defesa Econômica, em outubro de 1942, entregando-a a um homem de sua inteira confiança, dublê de militar e diplomata, presidente do Conselho do Comércio Exterior, coronel João Alberto, que passou a ser ‘uma espécie de Tzar da Economia’, com poderes para regular a produção, a exportação, a importação, os transportes, a circulação de mercadorias, os preços e o racionamento.

Antes da criação desse órgão tão vital, foram tomadas medidas pelo governo em garantia de nossa autonomia e para ressarcimento dos danos a nós causados pelos inimigos. Em primeiro lugar, foram incorporados ao patrimônio nacional os navios do eixo surtos nos nossos portos: oito barcos italianos e oito da Dinamarca (país ocupado pela Alemanha). Acrescente-se à lista três barcos alemães e um finlandês.” (p. 129)


Capítulo X - Povo organiza-se para a guerra

O Brasil, afinal, iria engajar-se num conflito das proporções da Segunda Guerra Mundial. Todos os brasileiros teriam que dele participar. Além das convocações dos efetivos e dos reservistas das classes armadas, cabia, também, à população civil sua parcela no esforço de guerra.

As mulheres organizaram-se como enfermeiras, havendo vários cursos, coordenados pela Cruz Vermelha Brasileira, praticando em diferentes hospitais, ou então nos grupos denominados Defesa Passiva, que tratavam da defesa civil das cidades. Nas escolas primárias, as unidades de trabalho tinham por temas a guerra, o soldado, a defesa da pátria, etc. Foram organizadas as Hortas da Vitória, incutindo no espírito dos jovens o desejo de participar, de alguma forma, ajudando o abastecimento da população.

Nas ruas das principais cidades do país, viam-se, nas calçadas, pilhas enormes de objetos de metal, que poderiam ser aproveitados ou pela indústria ou pelas Forças Armadas. Eram as Pirâmides da Vitória. Em toda orla marítima, foi imposto o blecaute total, nas outras zonas das cidades as luzes foram diminuídas em intensidade. Nas casas, o consumo de energia foi restringido. Quem ultrapassasse a cota que lhe cabia teria a ligação elétrica cancelada. Em vários setores profissionais foram distribuídos questionários para que as pessoas informassem suas habilitações: conhecimento de idiomas estrangeiros, possuidor de automóveis, motocicletas ou bicicletas, assim como de máquinas de escrever, de costura e fotográfica.” (p. 135)

As organizações patrióticas cresceram extraordinariamente nos tumultuosos dias que antecederam e sucederam à declaração da guerra [22 de agosto de 1942]. Fortaleceram-se de tal modo, pela justeza de sua linha de união nacional e de ajuda ao esforço de guerra, que passaram, em determinado momento, a merecer a confiança do governo da Bahia e a dividir com ele as ações contra a quinta-coluna e de vigilância aos alemães e italianos. Com essa finalidade foi organizado um Comitê de vigilância, secreto, que articulava diretamente com a Secretaria de Segurança Pública, dela recebendo armas para a autodefesa de seus componentes. [...]

As primeiras prisões de súditos do Eixo foram efetuadas por agentes do movimento patriótico: universitários, profissionais liberais e pessoas que exerciam outras atividades. A certa altura, antes de terem sido cassadas as credenciais concedidas pela Polícia, ficamos temerosos quanto à violência e ao abuso de poder que começaram a ser cometidos conta familiares dos súditos do Eixo por elementos inescrupulosos que se envolveram em casos de extorsão e roubo de bens.

Os alemães presos foram levados para o Quartel da Guarda Civil, com sede na rua Carlos Gomes.

Em janeiro de 1943, essas prisões atingiram 156 indivíduos, dos quais 141 eram alemães, dez italianos, dois austríacos, um japonês, um húngaro e um alemão naturalizado brasileiro. [fonte : A ‘Bahia na II Guerra Mundial’ – artigo de Consuelo Novaes Sampaio, da Academia de Letras da Bahia, publicado no jornal A Tarde, Salvador, edição de 06/05/94.]” (p. 141)


O Brasil, a União Soviética e as Nações Unidas

Embora fosse evidente e inevitável a integração do brasil às Nações Unidas, na qualidade de país aliado dos Estados Unidos, Inglaterra, Rússia, China e outros países, esse assunto era um tabu para o anticomunista governo brasileiro.

Quando, logo após a entrada do Brasil na guerra, chegaram de Washington sinais de que o governo soviético estaria interessado em uma reaproximação, o Catete insistiu em manter ‘uma atitude discreta e reservada’.

Havia, assim, limites à ação do Itamaraty, que foi obrigado, por exemplo, a instruir diplomatas no exterior, nesse período, a evitarem quaisquer ‘relações oficiais’ com colegas soviéticos. Mas Osvaldo Aranha, compreendendo que o Brasil acabaria sendo obrigado a entender-se com a Rússia, resolveu ir preparando o terreno. No início de novembro de 1942, enquanto se travava a gigantesca batalha de Stalingrado, enviou uma mensagem a Moscou na forma de uma mensagem à sucursal da TASS, agência noticiosa soviética nos estados Unidos, sobre o esforço de guerra da URSS :

Como V. sabe, divergimos profundamente da Rússia sobre todos os aspectos que fazem a união dos povos, a religião, a economia, a organização política e social. Mas, nesta hora não podemos ocultar a simpatia e a admiração que nos merece uma nação agredida, um governo com decisão e um povo em cuja capacidade de resistência repousa a nossa preparação para sobreviver.”

O DIP [Departamento de Imprensa e Propaganda, criado em 1939] proibiu sua divulgação pela imprensa brasileira, mas a mensagem foi publicada no exterior.” (pp. 145-46)

Quando Roosevelt, em janeiro de 1943, encontrou-se com Vargas, em Natal, o presidente da nação norte-americana solicitou ao chefe do governo brasileiro a entrada de nosso país para a Nações Unidas. O Brasil aderiu à Carta do Atlântico e à Organização das Nações Unidas, em 9 de abril do mesmo ano, sendo este o ‘primeiro ato político do Estado Novo de reconhecimento dos valores permanentes da democracia e da liberdade, que posteriormente iria influir no destino do país’ [fonte: O globo expedicionário, Agência Globo Serviços de Imprensa Ltda., Rio de Janeiro, p. 66].” (pp. 149-150)

Mais no cap. XIV, Encontro de Getúlio e Roosevelt em Natal, em janeiro de 1943, “[no dia 28] voltaram ao [navio destroier] Humboldt para o jantar. Reunião íntima da qual participaram, além de Getúlio e Roosevelt, o embaixador Caffery e Harry Hopkins, assistente do presidente americano. Roosevelt contou a Vargas quais as resoluções tomadas em [Conferência de] Casablanca:

1º)Ofensiva no Mediterrâneo, começando por um ataque à Sicília no próximo verão europeu. Isto visava garantir as linhas de comunicação no Mediterrâneo, desviar a atenção alemã da frente russa e iniciar a campanha cujo objetivo era afastar a Itália da guerra.

2º)Congregar na Inglaterra a maior força possível para invadir o continente europeu através do Canal da Mancha, logo que a resistência alemã fosse enfraquecida.

3º)Continuar com a mais poderosa ofensiva aérea contra a Alemanha, visando à invasão daquele país.

4º)Intensificar a campanha anti-submarinas.

5º)Continuar a sustentar a União Soviética, enviando a maior quantidade possível de suprimento.

6º) Manter a campanha contra o Japão dentro de certos limites. Descarregar a maior ofensiva contra o Japão, logo que a Alemanha fosse vencida.

7º)Traçar planos para a recaptura de Burma [ou Birmânia] e para as operações contra as ilhas Carolinas e Marshall.

[...]

No final das conversações, foi expedido um comunicado conjunto que tranquilizasse seus povos, falando no sucesso das operações que se desenvolveram no Norte da África, o que eliminava a possibilidade de uma ameaça nazista partida de Dacar contra a liberdade das Américas.” (pp.170-171)

No Cap. XII – O Brasil quer ir aos campos de batalha – “Ao iniciar-se 1943, decorridos quatro meses da entrada do Brasil na guerra, apossou-se do movimento patriótico e antifascista uma insólita crença na vitória das Nações Unidas, ainda naquele ano. Quatro grandes temas dominavam as atenções do povo brasileiro: a abertura da segunda frente, o envio de um corpo expedicionário aos campos de batalha, a anistia e a vitória final.” (p. 159)

Mas o povo brasileiro vivia numa contradição, com um governo dividido entre liberais e socialistas contra direitistas e militaristas, no contexto de um poder autoritário centralizado na figura ‘paternal’ do ditador Vargas,

Vivendo grave e profunda contradição interna, entre duas correntes antagônicas, o governo vacilava, não adotava com rapidez as medidas inadiáveis para o esforço de guerra. Daí a necessidade de o povo voltar às ruas, para empurrar Getúlio Vargas em direção às forças que apoiavam os aliados, intensificando as demonstrações de massa para exigir o envio de tropas brasileiras à frente de batalha. Na verdade, o movimento patriótico e, particularmente, os comunistas estavam eufóricos e acreditavam numa próxima vitória. Seria, portanto, vergonhoso para o Brasil manter-se à margem, além de se tornar politicamente perigoso, pois poderíamos internamente perder a paz. A presença de tropas brasileiras nos campos de batalha era fundamental para assegurar-nos as conquistas democráticas decorrentes da derrota do nazi-fascismo.

Visando comemorar o primeiro aniversário do rompimento de relações com o eixo, no dia 28 de janeiro de 1943, foram organizadas as primeiras manifestações populares daquele ano, realizando-se no Rio de Janeiro grande mobilização popular.” (p. 173)

Com o histórico encontro de Natal e a estrondosa vitória dos russos em Stalingrado [em fevereiro de 1943], reacendeu-se a chama da esperança no coração dos antifascistas de todo o mundo. O movimento patriótico tomou novo impulso. Na Bahia, decidiu realizar dois grandes atos públicos, nos dias 2 e 19 de abril. Nessa última data aniversariava o presidente Vargas.” (p. 175)

Todos os segmentos sociais seriam mobilizados. Era preciso abalar as estruturas, sacudir o governo e libertá-lo das amarras do setor pró-fascista, que ainda detinha uma parcela significativa do poder e vinha travando o esforço de guerra.

A data do natalício de Vargas sempre fora comemorada, em todo o país, pelos áulicos do governo, mas nesse ano as forças antifascistas tomaram-na em suas mãos, para fazer dela uma extraordinária manifestação nacional em favor dos nossos aliados e do envio de um corpo expedicionário para marcar a presença do Brasil nos campos de batalha.” (p. 176)

A 1º de maio, foram realizadas em todo o país manifestações antifascistas, no Dia do Trabalho. com uma grande concentração na Esplanada do Castelo, no Rio de Janeiro, 100 mil pessoas prestaram significativa homenagem ao chefe da nação, que falou ao povo e foi muitas vezes ovacionado.” (p. 178)

No dia 11 de maio realizou-se em frente ao Teatro Municipal do rio um comício monstro contra a quinta-coluna, o integralismo e o nazi-fascismo. Organizações estudantis e sindicatos carregavam cartazes que exaltavam os líderes das Nações Unidas, e outros com os seguintes dizeres: ‘Abaixo o Integralismo’; ‘morte à Quinta-Coluna’ e ‘Enviemos uma força expedicionária’.” (p. 179)


Convocação de reservistas – Em janeiro de 1943, o Ministério da Guerra decretou a mobilização geral, convocando os reservistas das classes de 1919 a 1921. Os quartéis encheram-se, pelo Brasil afora, de jovens entre 21 e 23 anos de idade, de todas as camadas sociais, incluindo estudantes que desfilavam pelas ruas pedindo a guerra.” (p. 187)

Na verdade, nossas forças armadas não estavam preparadas para receber dezenas de milhares de convocados em suas fileiras e dar-lhes um destino adequado, preparando-os para a guerra moderna. Não havia vontade nem disposição para isso. Predominava nos altos escalões do Ministério da Guerra, chefiado por dois generais germanófilos, Eurico Dutra e Góis Monteiro, o espírito antialiado, isto é, fazer a guerra aqui mesmo, preparar a defesa do Brasil com armas americanas e jamais enviar tropas para lutar lá fora, ao lado das Nações Unidas, como o povo desejava e pedia nas praças públicas.

A convocação fora malfeita, sem critérios claros e definidos, sem um plano adredemente preparado. O tratamento aos convocados era, às vezes, hostil e insultuoso por grande parte de oficiais, sargentos e cabos.” (p. 188)



Continuaremos - na postagem de agosto – os detalhes do recrutamento e da preparação da força expedicionária, que seguiria no ano seguinte, 1944, para os campos de batalha na Europa, quando da ocupação da Itália por forças Aliadas combatendo os nazi-fascistas.



Fonte: FALCÃO, João. O Brasil e a 2ª Guerra. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999.




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