Batalha
de Stalingrado
outubro
– novembro / 1942
As últimas ofensivas alemãs
e a reação
das forças soviéticas
(Cap.
11
– Traidores
e
Aliados)
“Durante
o
início
do
outono
de
1942,
as
autoridades
do
serviço
secreto
do
Exército
Vermelho
tinham
apenas
uma
vaga
ideia
da
dependência
da
Wehrmacht
dos
'Hiwis'
– diminutivo
para
'Hilfswillige'
ou
ajudante
voluntário.
Embora
alguns
fossem
voluntários
autênticos,
a
maioria
era
de
prisioneiros
soviéticos
de
guerra,
recrutados
de
campos
para
compensar
faltas
de
efetivo
humano,
sobretudo
como
trabalhadores
braçais,
mas
cada
vez
mais
constantes
em
funções
de
combate.
O
coronel Groscurth, chefe do estado-maior do XI Corpo do Exército na
maior curva do Don, observou numa carta ao general Beck: 'É
perturbador que sejamos obrigados a reforçar nossas tropas de
combate com prisioneiros de guerra russos, que já estão sendo
transformados em atiradores. É um estranho estado de coisas o fato
de as 'feras' contra as quais temos lutado estarem agora vivendo
conosco na mais íntima harmonia.' O Sexto Exército tinha mais de 50
mil auxiliares russos vinculados às suas divisões da linha de
frente, representando mais de um quarto de sua força militar. As 71ª
e 76ª divisões de infantaria tinham mais de 8 mil 'Hiwis' cada,
aproximadamente o mesmo número de homens, como sua força militar
total alemã em meados de novembro. (Não há nenhuma estimativa do
número de Hiwis vinculados ao resto do Sexto Exército e outras
formações subsidiárias, que, segundo algumas avaliações,
elevariam o total para 70 mil.)
[…]
Muitas
das
chamadas
unidades
cossacas
formadas
para
repressão
antipartisan
e
na
área
da
retaguarda,
por
ele
[um
prisioneiro
sobrevivente]
mencionadas,
tinham
uma
alta
proporção
de
ucranianos
e
russos.
Hitler
detestava
a
ideia
de
escravos
Untermensch
em
uniformes
alemães,
por
isso
eles
tiveram
de
ser
redefinidos
como
cossacos,
considerados
aceitáveis
em
termos
raciais.
Isso
refletia
a
divergência
fundamental
entre
a
hierarquia
nazista,
obcecada
com
a
total
subjugação
dos
eslavos,
e
os
oficiais
do
exército
profissional,
que
acreditavam
que
sua
única
esperança
era
agir
como
os
libertadores
da
Rússia
do
comunismo.
Já
no
outono
de
1941,
o
serviço
secreto
do
Exército
alemão
chegara
à
conclusão
de
que
a
Wehrmacht
talvez
não
conseguisse
vencer
na
Rússia,
a
não
ser
que
transformasse
a
invasão
numa
outra
guerra
civil
[em
1918-21,
os
combates
entre
soviéticos
da
Guarda
Vermelha
contra
os
monarquistas
da
Guarda
Branca].”
pp.
215-16
“Para
as
autoridades
soviéticas,
a
ideia
de
ex-soldados
do
Exército
Vermelho
servindo
na
Wehrmacht
era
profundamente
perturbadora.
Tiraram
a
conclusão
precipitada
de
que
os
expurgos
e
o
trabalho
dos
departamentos
especiais
não
haviam
sido
nem
de
longe
suficientes.
O
departamento
político
da
Frente
de
Stalingrado
e
o
NKVD
ficaram
obcecados
com
a
utilização
de
Hiwis
para
se
infiltrar
e
atacar
as
linhas
soviéticas.
'Em
algumas
partes
do
front',
informaram
a
Scherbakov,
'têm
havido
casos
de
ex-russos
que
usam
uniformes
do
Exército
Vermelho
e
penetram
em
nossas
posições
com
a
finalidade
de
reconhecimento
e
capturam
os
oficiais
e
soldados
presos
para
interrogatório'.
No
setor
da
38ª
Divisão
de
Fuzileiros
(64º
Exército),
na
noite
de
22
de
setembro,
uma
patrulha
de
reconhecimento
soviético
encontrou-se
por
acaso
com
uma
patrulha
alemã.
Os
soldados
do
Exército
Vermelho
informaram
ao
retornar
que
havia
pelo
menos
um
'ex-russo'
com
os
alemães.
A
expressão
'ex-russo'
iria
servir
como
sentença
de
morte
para
centenas
de
milhares
de
homens
no
decorrer
dos
três
anos
seguintes,
quando
a
SMERSH
se
concentrou
na
questão
da
traição,
tão
próxima
ao
coração
de
Stalin.
Ao
extirpar
sumariamente
a
identidade
nacional
dos
adversários
e
desertores,
a
União
Soviética
tentava
eliminar
qualquer
insinuação
de
insatisfação
na
Grande
Guerra
Patriótica.”
pp.
217-18
(Cap.
12
– Fortalezas
de
Escombros
e
Ferro)
“
'Stalingrado
se
tornará
uma
segunda
Verdun?',
escreveu
o
coronel
Groscurth
em
4
de
outubro.
'É
o
que
nos
perguntamos
com
grande
preocupação.'
Após
o
discurso
de
Hitler
no
Berlin
Sportpalast
quatro
dias
antes,
afirmando
que
ninguém
jamais
os
deslocaria
de
sua
posição
no
Volga,
Groscurth
e
outros
sentiram
que,
fossem
quais
fossem
as
consequências,
não
se
daria
permissão
ao
Sexto
Exército
para
interromper
aquela
batalha.
'Tornou-se
até
uma
questão
de
prestígio
entre
Hitler
e
Stalin.'
O
grande
ataque
alemão
contra
o
distrito
industrial
no
norte
de
Stalingrado
começara
com
êxito
em
27
de
setembro,
mas
ao
aproximar-se
do
fim
do
segundo
dia,
as
divisões
alemãs
sabiam
que
ainda
tinham
pela
frente
os
combates
mais
árduos.
O
complexo
da
Outubro
Vermelho
e
a
fábrica
de
armas
Barrikadi
haviam-se
tornado
fortalezas
tão
letais
quanto
as
de
Verdun.
Mais
perigosas
ainda,
porque
os
regimentos
soviéticos
se
achavam
muito
bem
escondidos.”
(p.
219)
“Os
ataques
alemães
intensificaram-se
outubro
adentro,
sobretudo
quando
reforçados
pela
94ª
Infantaria
e
a
14ª
Divisão
de
panzers,
além
de
cinco
batalhões
de
engenheiros
de
combate
enviados
especialmente
para
lá.
Do
lado
soviético,
as
unidades
encontravam-se
fragmentadas
e
muitas
vezes
tiveram
todas
as
comunicações
avariadas,
mas
os
indivíduos
e
grupos
continuavam
a
combater
sem
ordens.
[...]”
(p.
221)
“As
travessas
do
Volga
tornaram-se
cada
vez
mais
vulneráveis
com
a
drástica
redução
do
perímetro
do
62º
Exército.
As
baterias
alemãs
e
mesmo
as
metralhadoras
miravam
nos
pontos
de
desembarque.
Um
batalhão
dos
barqueiros
de
Iaroslavl
construíra
uma
estreita
ponte
flutuante
da
ilha
Zaitsevski
até
a
margem
ocidental.
Isso
permitiu
a
travessia
durante
a
escuridão
de
uma
constante
corrente
de
transportadores,
semelhante
a
formigas,
com
rações
e
munições.
Seu
pequeno
tamanho
reduzia
o
alvo,
mas
para
os
que
trilhavam
o
caminho
das
pranchas
em
movimento
contínuo,
as
granadas
que
explodiam
nos
dois
lados
do
rio
tornavam
cada
jornada
apavorante.
Os
cargueiros
ainda
eram
necessários
para
artigos
maiores
e
mais
pesados,
além
de
evacuar
os
feridos.
[...]”
(p.
222)
“Naquela
segunda
semana
de
outubro,
fez-se
uma
calmaria
no
combate.
Chikov
desconfiou,
corretamente,
de
que
os
alemães
preparavam
um
ataque
ainda
maior,
na
certa
com
reforços.
Paulus
sofria
tanta
pressão
de
Hitler
quanto
Chuikov
de
Talin.
Em
8
de
outubro,
o
Grupo
B
do
Exército,
por
ordens
do
quartel-general
do
Führer,
instruíra
o
Sexto
Exército
a
preparar
outra
importante
ofensiva
contra
o
norte
de
Stalingrado,
a
começar,
no
mais
tardar,
em
14
de
outubro.
Paulus
e
o
estado-maior
do
seu
quartel-general
ficaram
desanimados
com
as
perdas
sofridas.
[...]”
(p.
224)
“ÀS
6:00h
da
manhã
da
segunda-feira,
14
de
outubro,
começou
a
ofensiva
do
Sexto
Exército
numa
linha
de
frente
estreita,
usando
todos
os
Stukas
disponíveis
da
Quarta
Frota
Aérea
do
general
von
Richthofen.
'todo
o
céu
ficou
coalhado
de
aviões',
escreveu
um
soldado
da
389ª
Divisão
de
Infantaria
à
espera
de
ir
para
o
ataque,
'cada
canhão
antiaéreo
disparando,
bombas
caindo
estrondosas,
aeronaves
se
espatifando,
uma
enorme
obra
teatral
que
acompanhávamos
das
nossas
trincheiras
com
sentimentos
muito
contraditórios.'
A
artilharia
e
o
fogo
de
morteiro
alemães
despedaçavam-se
em
abrigos
subterrâneos,
e
os
projetis
de
fósforo
ateavam
fogo
em
qualquer
remanescente
de
material
combustível.
'O
combate assumiu proporções monstruosas, além de toda possibilidade
de avaliação', escreveu um dos oficiais de Chuikov. 'Os homens nas
trincheiras de comunicação tropeçavam e caíam como num convés de
navio durante uma tempestade.' Os comissários sentiam que
visivelmente uma urgência de tornar-se poéticos. 'Aqueles entre nós
que viram o céu escuro de Stalingrado naqueles dias', escreveu
Dobronin a Scherbakov em Moscou, 'jamais o esquecerão. É ameaçador
e severo, com chamas purpúreas lambendo o céu.' “ (p. 225)
“Durante
os
seis
dias
de
combate
desde
14
de
outubro,
a
Luftwaffe
manteve
postos
de
força
aérea
atacando
travessias
de
rio
e
tropas.
Raro
era
o
m,omento
em
que
não
se
ouviam
aeronaves
alemãs
sobrevoando.
'A
ajuda
da
nossa
força
de
caças
é
necessária',
observou
o
departamento
político
da
Frente
de
Stalingrado
numa
crítica
em
código
à
aviação
do
Exército
Vermelho
transmitida
a
Moscou.
Na
verdade,
o
8º
Exército
Aéreo
estava
reduzido
a
menos
de
200
aparelhos
de
todos
os
tipos,
dos
quais
apenas
uma
dezena
era
de
caças.
Mas
mesmo
os
pilotos
da
Luftwaffe
compartilhavam
a
desconfiança
cada
vez
maior
das
tropas
de
terra
de
que
os
defensores
russos
de
Stalingrado
talvez
acabassem
se
revelando
invencíveis.
[...]”
(p.
228)
“Uma
forma
de
repressão
política
no
Exército
Vermelho
na
verdade
vinha
relaxando
nessa
época.
Stalin,
numa
deliberada
política
de
levantar
o
moral,
já
anunciara
a
introdução
de
condecorações
com
um
sabor
decididamente
reacionário,
como
as
Ordens
de
Kutuzov
e
Suvorov.
Mas
sua
reforma
mais
aberta,
anunciada
em
9
de
outubro,
foi
o
Decreto
307,
que
restabelecia
o
comando
único.
Os
comissários
foram
rebaixados
a
uma
função
conselheira
e
'educacional'.
[…]
“As
principais
condecorações
comunistas
– Herói
da
união
Soviética,
Ordem
da
Bandeira
Vermelha,
Ordem
da
Estrela
Vermelha
– continuavam
sendo,
claro,
levadas
muito
a
sério
pelas
autoridades
políticas,
embora
a
Estrela
Vermelha
se
houvesse
tornado
uma
espécie
de
ração
stakhanovista,
concedida
a
todo
homem
que
destruísse
um
tanque
alemão.
[...]”
pp.
234-35
“De
fato,
as
verdadeiras
estrelas
stakhanovistas
do
62º
Exército
não
eram
os
destruidores
de
tanques,
mas
os
franco-atiradores.
Lançou-se
um
novo
culto
de
'franco-atiradorismo'
e,
com
a
aproximação
do
vigésimo
quinto
aniversário
da
Revolução
de
Outubro,
a
propaganda
que
envolvia
essa
arte
negra
se
tornou
frenética,
com
'uma
nova
onda
de
competição
socialista
pelo
maior
número
de
Fritzes
mortos'.
Um
'franco-atirador'
ao
alcançar
quarenta
mortes
recebia
a
medalha
'Por
Bravura'
e
o
título
de
'Nobre
Franco-atirador'.”
(p.
236)
(Cap.
13 – O Último Ataque de Paulus)
“Em
8
de
novembro,
o
dia
seguinte
ao
aniversário
da
revolução,
Hitler
fez
um
longo
discurso
na
Bürgerbraukeller
em
Munique,
para
os
'Velhos
Combatentes'
nazistas.
-Eu
queria
chegar
ao
Volga
– declarou
com
forte
ironia
-,
para
ser
preciso,
a
um
determinado
lugar,
a
uma
determinada
cidade.
Por
acaso,
tem
o
nome
do
próprio
Stalin.
Mas
não
pensem
que
marchei
até
lá
por
esse
motivo,
foi
porque
ela
ocupa
uma
posição
muito
importante...
Eu
queria
capturá-la
e,
como
vocês
devem
saber,
estamos
muito
contentes,
praticamente
já
a
tomamos!
Só
faltam
pequenos
pedaços.
Alguns
dizem:
'Por
que
não
combatem
mais
rápido?'
Por
que
não
quero
uma
segunda
Verdun
e
prefiro,
em
vez
disso,
fazer
o
trabalho
com
pequenos
grupos
de
assalto.
O
tempo
não
tem
a
menor
importância.
Não
serão
mais
embarcados
navios
pelo
Volga.
E
este
é
o
ponto
decisivo!
Seu
discurso
classificava-se
entre
os
maiores
exemplos
de
arrogância
da
história.
O
Afrikakorps
já
se
retirava
de
Alamein
pela
Líbia
adentro,
e
as
forças
anglo-americanas
haviam
acabado
de
desembarcar
ao
longo
da
costa
africana,
na
Operação
Tocha.
Ribbentrop
aproveitou
a
oportunidade
para
sugerir
uma
negociação
com
Stalin
por
meio
da
embaixada
soviética
em
Estocolmo.
-Hitler
recusou
sem
rodeios
– observou
seu
ajudante
da
Luftwaffe.
-Disse
que
um
momento
de
fraqueza
não
é
a
hora
certa
de
lidar
com
um
inimigo.
As
insensatas bazófias sobre Stalingrado que se seguiram a essa recusa
não eram apenas reféns do destino: iriam acuá-lo numa condenação
ao desastre. O demagogo político agrilhoara o senhor da guerra. Logo
se confirmariam os piores temores de Ribbentrop na véspera da
Barbarossa [em 22 de junho de 1941].” (pp. 248-49)
“Em
Stalingrado,
o
verdadeiro
inverno
chegou
no
dia
seguinte,
com
a
temperatura
caindo
para
dezoito
graus
centígrados
negativos.
O
Volga,
que
devido
ao
seu
tamanho
era
um
dos
últimos
rios
da
Rússia
a
congelar,
começou
a
ficar
inavegável.
'As
banquisas
de
gelo
colidem,
desfazem-se
e
trituram-se
umas
às
outras',
escreveu
Grossman,
'e
pode-se
ouvir
o
som
vergastante,
como
de
areias
movediças,
de
uma
grande
distância
da
margem',
um
sinistro
som
para
os
soldados
na
cidade.”
(p.
249)
fonte:
BEEVOR,
Antony.
Stalingrado.
O
Cerco
Fatal.
Trad.
Alda
Porto.
Record,
2005.
more
info
Operação
Barbarossa
Afrikakorps
em
retirada
Operação
Tocha
sobre
a
SMERSH
fotos
filme
russo
“the
Battle of
Stalingrad”
(Сталинградская
битва,
1949)
filme
alemão
“Stalingrad”
/ 1993
Enemy
at the
Gates /
2001
seleção
by
LdeM
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