sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Relações do Papado com o Nazismo - continua 2





Relações do Papado com o Nazismocontinuação 2


fonte: CORNWELL, John. O Papa de HitlerA História Secreta de Pio XII. (Hitler's Pope: the secret history of Pius XII. 1999) Trad. A . B. Pinheiro de Lemos. Rio de Janeiro: Imago Ed., 2000


A Concordata do Reich


Depois que o líder nazista Adolf Hitler aclamou a Concordata do Reich, em 20 de julho de 1933, assinada com o enviado do Vaticano, o cardeal Eugenio Pacelli, o futuro Papa XII, o governo nacional-socialista começou a política de esterilização dos 'doentes genéticos', também a controlar o número de alunos nas escolas (redução dos alunos de origem judaica) , além de que sacerdotes católicos participaram da 'burocracia de atestados anti-semitas', sendo que muitos destes atestados 'serviriam mais tarde para aplicar as Leis de Nurembergue.'

A posição dos líderes católicos na Alemanha, após a concordata, era a de um 'dilema moral'.A submissão clerical católica no processo continuaria ao longo de todo o período do regime nazista. Acabaria ligando a igreja católicae as Igrejas protestantes também - aos campos de extermínio. No caso da Santa Sé, porém, havia uma culpa muito maior, porque a extensão e coação implícitas na aplicação centralizada das leis canônicas, que Pacelli passara tanto tempo de sua carreira realçando e fortalecendo, não seriam empregadas para desafiar o processo. Na verdade o inverso parece ter acontecido.eEra essa a realidade do abismo moral a que Pacelli, o futuro pontífice levara à outrora poderosa e orgulhosa Igreja católica Romana. E a essa altura Pacelli não tinha mais qualquer ilusão sobre a natureza violenta do regime nazista.(pp. 172-73)

A assinatura da Concordata do Reich assinalou o início formal da aceitação pelo catolicismo alemão de suas obrigações nos termos do tratado, que impunha como um dever moral aos católicos a obediência aos soberanos nazistas. Com isto, os críticos católicos se calaram. Uma grande Igreja, que poderia ter se tornado a base para uma oposição, tratou de se confinar à sacristia. Houve notáveis exceções, como, por exemplo, os sermões do Advento do cardeal Faulhaber, no outono daquele ano, mas não passaram de atos individuais de desafio (embora qualificados). Não houve nada que parecesse sequer remotamente com um ato coordenado de protesto dentro da Alemanha, nem mesmo sobre questões relacionadas com as violações dos termos do tratado.(p. 175)

[...] Os bispos votaram por um pedido a Pacelli para ratificar o tratado sem demora, na tênue convicção de que a ratificação poderia melhorar a situação; mas também lhe pediram que transmitisse ao regime uma lista de suas queixas, entre as quais uma patética defesa dos judeus convertidos ao catolicismo. O fato de que ele agora consideravam necessário pedir a Pacelli que falasse em defesa dos judeus convertidos indicava a fraqueza intrínseca da política da secretaria de Estado, envolvendo longos intervalos entre atos de perseguição e a reação em Roma.

A súplica dos bispos a Pacelli dizia: 'Seria possível para a Santa interferir com o devido empenho pelos cristãos que se converteram do judaísmo, que estão sofrendo grandes dificuldades, junto com seus filhos e netos, por causa da ascendência não-ariana?'(p. 176)

As atuações de Pacelli foram sempre contra as esquerdas, acusando políticas e crimes, mas sempre evitando acusar os acordos e violências das direitas em evidente avançoItália, Espanha, Alemanha, Aústria, etcdesde que os governos de 'regime forte' se mantivessem em acordo com os interesses do Vaticano.

A vitória socialista nas eleições espanholas de fevereiro de 1936 culminara aquele verão com uma violência disseminada e a deflagração da guerra civil. A Igreja católica, identificada com o lado reacionário da divisão ideológica, foi vítima de algumas das piores atrocidades, cometidas em geral pelos anarquistas. Segundo fontes católicas, durante os 30 meses de guerra, mais de sete mil padres e religiosos foram assassinados. Pacelli, é claro, não podia deixar de ter conhecimento das atrocidades cometidas pelo lado de Franco, mas o Caudillo declarara que 'a Espanha será um império voltado para Deus'. E setembro, ao receber um grupo de peregrinos espanhóis, Pio XI condenou a 'iniciativa satânica' do marxismo, que promovera a guerra, e abençoou aqueles que defendiam 'os direitos e a honra de Deus contra uma explosão brutal de forças tao selvagens e tão cruéis que eram quase inacreditáveis'.

Apesar dos muitos discursos de Pacelli ao longo do ano sobre o tema de justiça e paz, o ataque de Mussolini à Etiópia, a 3 de outubro de 1935, não foi condenado pela Santa Sé. Nem Pio XI reprimiu a hierarquia italiana, que demonstrou o maior entusiasmo pela guerra. () embora Pio XI dissesse a um amigo em setembro que a guerra contra a Etiópia seria 'deplorável', suas declarações a respeito, depois do fato, foram tão complicadas e vagas que nunca representaram uma condenação clara.
pp. 193-94

Em reação à carta pastoral dos bispos [alemães, datada de 28 de agosto de 1935], Hitler declarou no congresso nazista , em Nurembergue, a 11 de setembro, que não era contra o cristianismo por si mesmo, 'mas lutaremos para manter nossa vida pública livrar daqueles padres que fracassaram em sua vocação e que deveriam ter se tornado políticos em vez de clérigos'.

Quatro dias depois, Hitler promulgou as Leis de Nurembergue, que definiam a cidadania alemã, preparando o caminho para a caracterização da situação de ser judeu em termos de parentalidade e casamento. Mais uma vez, não houve nenhuma palavra de protesto de Pacelli.

Na defensiva dentro da Alemanha, reprimida pelo controle centralizador do Vaticano, a igreja católica continuou, em 1936, a manter um estado de inércia cautelosa, animada apenas pelo duvidoso conforto de que a situação podia ser pior. No verão, as notícias de atrocidades contra freiras e padres na guerra civil espanhola indicavamcomo o próprio papa se apressou em ressaltaro quanto as coisas eram piores sob o 'bolchevismo'. [...]

O ano de 1937, no entanto, veria um aprofundamento das tensões entre os nazistas e a igreja católica. Na segunda semana de janeiro, os bispos reuniram-se em Fulda e preparam uma lista de 17 violações da concordata. Armados com suas queixas familiares, nada menos do que três cardeaisFaulhaber, Bertram e Schulte - , junto com dois bispos influentesClemens August von Galen e Konrad von Preysing -, partiram num ânimo decidido para uma conversa com Pacelli no Vaticano. [] [o papa Pio XI] decidiu fazer uma encíclica sobre a difícil situação da Igreja na Alemanha.

Faulhaber escreveu o primeiro esboço bem depressa e entregou-o a Pacelli na manhã de 21 de janeiro. Pacelli editou o texto e acrescentou informações sobre a história da concordata. Isto é significativo , pois a encíclica publicada, Mit brennender Sorge (Com Profunda Ansiedade), uma condenação direta e franca do tratamento dispensado pelo Reich à igreja,persiste para muitos católicos e não-católicos como um símbolo da corajosa franqueza papal, citado em contraste com o silêncio de Pacelli durante a guerra. Embora Pacelli possa assumir grande parte do crédito pelo documento final e os complexos acertos para sua publicação na Alemanha, a encíclica chegou tarde demais e deixou de condenar expressamente os nacional-socialistas e Hitler.(pp. 198-201)


fonte: CORNWELL, John. O Papa de HitlerA História Secreta de Pio XII. (Hitler's Pope: the secret history of Pius XII. 1999) Trad. A . B. Pinheiro de Lemos. Rio de Janeiro: Imago Ed., 2000


Mais info

a concordata do Reich


a encíclica Mit brennender Sorge / Pio XI, 1937


Leis de Nuremberg (1935)



seleção & comentários : LdeM

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