sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Rendição do VI Exército cercado em Stalingrado




Contra-ataque soviético cerca as tropas alemãs


Em quatro dias [19 a 23 de novembro], os russos haviam fechado o anel em torno do IV Panzerarmee e do VI Exército, com um total de vinte e duas divisões e cerca de trezentos e trinta mil homens. Zhukov e outros membros da Stavka, receando que forças do Eixo tentassem abrir caminho e saíssem da armadilha, decidiram que a frente externa fosse aumentada em mais cento e cinquenta quilômetros, a fim de impedir qualquer medida do Alto Comando alemão tendente a socorrer as forças sitiadas.


Von Paulus [marechal alemão] recebeu ordens estritas no sentido de permanecer onde estava e lutar, enquanto o Alto Comando alemão planejava o socorro ao VI Exército. O Marechal von Manstein, a quem foi dada a incumbência, declarou que, naqueles dias críticos do final de novembro, os russos poderiam ter destruído completamente o VI Exército e o Grupo A de Exércitos, mediante rápida investida ao longo do baixo Don, em Rostov.
[...]


A ‘Operação Koltso’ (Cerco) foi proposta à Stavka a 9 de dezembro e dois dias depois foram seus membros informados, inclusive Zhukov, que o plano havia sido reelaborado e expedida nova diretiva. A primeira fase da operação se constituiria numa investida na direção de Basargino e Voroponovo, objetivando destruir os grupos meridional e ocidental alemães. A fase seguinte seria o assalto geral a oeste e noroeste de Stalingrado, a ser executado pelas Frentes do Don e de Stalingrado. O início da operação seria anunciado ao comando através de uma ligação telefônica e esperava-se que a primeira fase estivesse completa por volta de 23 de dezembro, o mais tardar.
[...]


Quando a investida de Mannstein [iniciada em 12 de dezembro] foi obrigada a paralisar-se, ele e von Paulus viram um consolo no fato de as tropas alemãs que se encontravam sitiadas estarem servindo a um fim útil, isto é, atando ao terreno enorme massa de forças soviéticas. A ponte aérea prometida por Hermann Göring, que se adequadamente coordenada poderia abastecer a área até a primavera de 1943 – quando, ao que se imaginava, seria novamente conquistada pelos alemães – estava fracassando. A promessa de Göring de enviar 500 toneladas diárias de alimentos, combustíveis e munições revelou-se otimista em excesso. Com efeito, em fins de dezembro, pouco mais de uma centena de toneladas estava sendo entregue diariamente. Já em meados de dezembro, as tropas, famintas, começavam a matar os cavalos das divisões romenas, a fim de conseguir alimento.


A ‘Operação Koltso’ ganhou novo ímpeto e os russos mais e mais passaram a apertar o laço em torno das sitiadas forças alemãs. Com a conquista do aeródromo de Gumrak, o último elo de ligação dos sitiados com o mundo exterior deixou de existir. O inverno estava, também, cobrando dividendos muito elevados e, para aumentar a agonia das forças sitiadas, irrompeu no seio delas uma epidemia de tifo. Assim mesmo, von Paulus rejeitou, a 8 de janeiro, um ultimato para que se rendesse, e a 22 desse mês o Exército Vermelho já havia empurrado os alemães para os arrabaldes da cidade, encurralando o VI Exército numa fatia de terreno de forma oval, com pouco mais de 16 quilômetros de comprimento e 10 de largura, submetida a constante bombardeio por parte da artilharia e da aviação.


Várias unidades alemãs começaram a render-se, e no dia 31 de janeiro o Exército Vermelho deu início à investida final, convergindo, de todas as direções, para o centro de Stalingrado. No curso dessa operação, o Marechal von Paulus foi feito prisioneiro, juntamente com todo seu Estado-Maior. Enviado ao Q-G de Rokossovsky, von Paulus, alto, ereto, ainda mantendo toda a dignidade, perfilou-se, em posição de sentido, diante do marechal soviético. Ao lhe ser oferecida uma xícara de chá, aceitou, agradecido. Durante a conversa que se seguiu, von Paulus expressou a esperança de que os russos não o obrigassem a responder a perguntas que pudessem implicar quebra de juramento militar e seus captores prometeram que não o fariam. Rokossovsky solicitou-lhe, então, que ordenasse a suas tropas que cessassem a luta – sua desesperada resistência – mas von Paulus retrucou, dizendo que, como prisioneiro de guerra, não estava mais em condições de expedir ordens. Foi, então, conduzido para o confinamento; a guerra, para ele, havia terminado.


Na manhã de 1º de fevereiro, os soviéticos arrasaram as derradeiras posições inimigas. “De meu posto de observação”, recordaria, depois, Rokossovsky, “vimos um mar de obuses cobrir toda a área de luta. Nossos aviões, por sua vez, despejaram, também, um tapete de bombas sobre as últimas defesas alemãs. O canhoneiro durou algum tempo e, quando terminou, vimos inúmeras bandeiras brancas surgir em meio à terra revolta. Apareciam espontaneamente, contra o desejo do comando alemão, e embora em alguns lugares houvesse rendição, em outros, a luta prosseguia. Somente no dia seguinte, 2 de fevereiro, é que os remanescentes do VI Exército passaram a render-se em massa e a batalha de Stalingrado terminou de fato”.


Mais de noventa mil homens foram feitos prisioneiros, inclusive um marechal-de-campo e vinte e quatro generais. Muitos deles jamais voltariam à Alemanha.
[...]


Quando a batalha de Stalingrado terminou, Zhukov foi condecorado com a “Ordem de Suvorov”, de Primeira Classe. Outros comandantes receberam condecorações de menor importância. A 18 de janeiro de 1943, Zhukov foi elevado ao posto de Marechal da União Soviética – o primeiro dos grandes comandantes soviéticos da Segunda Guerra Mundial a receber tal honraria.”
pp. 107-110


Fonte: CHANEY Jr, Otto Preston. Zhukov – Marechal da União Soviética. Rio de Janeiro: Renes, 1976




A Rendição do VI Exército


Em 16 de janeiro, logo após a captura de Pitomnik, o quartel-general do Sexto Exército enviou um comunicado por sinal, queixando-se de que a Luftwaffe estava lançando suprimentos apenas com para-quedas.” p. 414


Sempre que os aviões da Luftwaffe decolavam e partiam, os homens erguiam os olhos ansiosos, e continuavam fitando o céu até bem depois de o minúsculo ponto desaparecer. “Com o coração oprimido”, escreveu um soldado, “acompanhávamos com o olhar o avião alemão e pensávamos em como seria maravilhoso ir embora, sair daquele inferno em que tínhamos sido abandonados.” Após a captura do campo de aviação de Gumrak no início da manhã de 22 de janeiro, só um punhado de aviões conseguira aterrissar na pequena faixa de pouso de Stalingradski. A ‘ponte aérea’, e assim a última linha de fuga, desmantelara.” p. 425


A retirada da estepe, enquanto o Kessel [bolsão] era esmagado pelos exércitos de Rokossovski, elevou o número de alemães apinhados na cidade arruinada para 100 mil homens. Muitos, embora não a maioria, sofriam de disenteria, icterícia e outras doenças, as faces tingidas de um amarelo esverdeado.”


[...]


Regimento e divisões ficaram totalmente sem propósito. A 14ª Divisão de panzers tinha menos de oitenta homens ainda em condições de combater. Mal restara um único tanque ou arma pesada com munição. Numa situação tão desesperadora como essa, a disciplina começava a desintegrar-se. A resistência continuava em grande parte por medo de vingança russa após a recusa de render-se de Paulus.” / pp. 427-28


A redução do bolsão sul continuava a toda velocidade. Em 30 de janeiro, tropas soviéticas haviam penetrado no centro mesmo da cidade. Nos porões, onde as concentrações de alemães se abrigavam do frio e do fogo de artilharia, predominava um clima de desespero e assustadora antecipação.”


[...]


Muitos homens ficaram desequilibrados pela tensão dos combates ou alucinações por grave desnutrição. Os porões enchiam-se de homens urrando em delírio.” / p. 433


A Rendição
O marechal-de-campo Paulus, acompanhado pelo tenente Lev Beziminski do serviço secreto do Exército Vermelho, foi levado do quartel-general do 64º Exército, no carro do seu próprio estado-maior, ao quartel-general da frente do Don, na periferia de Zavarikino, a uns oitenta quilômetros de Stalingrado. Schmidt e Adam acompanhavam-nos escoltados em outra viatura. Conduziram-nos aos alojamentos, outra izba [cabana rural] de cinco paredes. Um destacamento da guarda permanente, sob o tenente C. M. Bogomolov, aguardava-os. Os outros 'generais de Stalingrado' foram levados para um izba próxima, onde eram vigiados pelo tenente Spektor e um pelotão.
Bogomolov e seus homens, com entusiástica consciência do momento histórico, olhavam fascinados os seus prisioneiros. O alto Paulus teve de abaixar-se ao entrar. Seguindo o exemplo de Adam, abandonara o quepe por um gorro de pele ushanka. Ainda usava o uniforme de general. Paulus foi seguido pelo general Schmidt e o coronel Adam, que impressionou os guardas com seu 'ótimo domínio do russo'. O soldado motorista de Paulus chegou por último carregando suas pesadas malas. O Mercedes do estado-maior foi logo apropriado pelo general W. I. Kazakow, o comandante de artilharia do front.


[..]


O clima estava tenso na izba de Voronov quando o importante 'convidado' chegou. O alto, magro, curvado Paulus oferecia uma figura cinzenta, com seu uniforme 'cor de camundongo' e o rosto pálido de tensão nervosa. Os cabelos estavam ficando grisalhos, e até a incipiente barba estava preta e branca. [...]”
pp439-42


Os comandante soviéticos exigem que Paulus envie um comunicado às tropas do VI Exército para que deixem de resistências e finalmente aceitem a rendição, afinal o próprio comandante acabara de se render. Paulus hesita e recusa. Os soviéticos ameaçam, ou falam de um 'ato humanitário', pois Paulus poderia evitar o massacre dos soldados alemães.


Hitler soube das notícias na fortemente guardada Wolfsschanze embrenhada na floresta da Prússia Oriental, lugar certa vez descrito pelo general Jodl como um misto de mosteiro com campo de concentração. Não deu um soco na mesa desta vez, mas baixou os olhos em silêncio para a sopa.


A voz e a raiva retornaram no dia seguinte. O marechal-de-campo Keitel e os generais Jeschonnek, Jodl e Zeiztler foram todos convocados para a conferência de meio-dia do Führer.


-Eles se renderam lá formal e absolutamente – disse Hitler, com irada descrença. - Senão, teriam cerrado fileiras, formado uma defesa com obstáculos de arame farpado e atirado em si mesmos com a última bala. Quando penso que uma mulher tem o orgulho de sair, trancar-se e logo se matar só porque ouviu algumas observações ofensivas, não posso ter o menor respeito por um soldado que tem medo disso e prefere ir para o cativeiro.


[…]


Hitler continuou voltando repetidas vezes ao fiasco de Paulus por não haver se suicidado. Sem a menor dúvida, aquilo manchara inteiramente o mito de Stalingrado em sua imaginação.” / p. 444


A manhã de 2 de fevereiro começou com um denso nevoeiro, depois disperso pelo sol e um vento de açoite, levantando a neve pulverizada. A notícia da rendição final espalhou-se pelo 62º Exército, foguetes de sinalização foram disparados céu adentro numa exibição de improviso. Os marinheiros da flotilha do Volga e os soldados da margem esquerda atravessaram o gelo com formas de pão e latas de comida para os civis que haviam ficado encurralados durante cinco meses em porões e buracos.


Grupos e indivíduos circulando nas redondezas abraçavam maravilhados os que encontravam. As vozes saíam abrandadas no ar glacial. Não faltavam pessoas na paisagem descolorida de ruínas, mas a cidade parecia deserta e vazia. É improvável que o fim tenha sido inesperado, ou mesmo repentino, mas os defensores russos achavam difícil acreditar que terminara a batalha de Stalingrado. Quando pensavam nela e lembravam os mortos, sua própria sobrevivência os espantava. De cada divisão enviada pelo Volga, não mais que uma centena de homens sobreviveu. Em toda a campanha de Stalingrado, o Exército Vermelho sofrera 1 milhão e 100 mil baixas, das quais 485.751 haviam sido fatais.” / pp. 447-48

Fonte: BEEVOR, Antony. Stalingrado – O Cerco Fatal. Rio de Janeiro: Record, 2005.


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seleção & resumos : LdeM


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