Conferência
de Casablanca
14
– 24 janeiro 1943
“era
uma felicidade o fato de estar próxima a realização de uma
conferência de cúpula, considerada indispensável não só para
unificar a estratégia anglo-americana no ocidente, mas igualmente
indispensável para a elaboração de uma doutrina comum no oriente."
"Roosevelt
[presidente dos Estados Unidos da América] tinha plena consciência desta necessidade. Na verdade, a reunião de
Casablanca originou-se de um telegrama por ele endereçado a
Churchill [ primeiro-ministro britânico] em 26 de novembro. Dizia: “Acho que devemos convocar uma
conferência militar sobre estratégia entre a Grã-Bretanha, a União
Soviética e os Estados Unidos, tão logo expulsemos os alemães da
Tunísia”. Rápida e sabiamente Churchill alçou a ideia para um
escalão mais elevado, recomendando não apenas a reunião entre os
estados-maiores, mas sim entre os lideres: “Em Moscou Stalin [ditador soviético] deu-me
a entender que gostaria de encontrar-se com o senhor e comigo em
algum lugar, neste inverno; mencionou a Islândia.” Entretanto, no
momento Stalin não pensava em afastar-se da União Soviética, pois
a batalha de Stalingrado atravessava uma fase crítica; como
consequência, procedeu-se a uma reunião anglo-americana com a
participação do Primeiro-Ministro, do Presidente e dos Chefes do
Estado-Maior Conjunto, em local que Churchill descrevera para
Roosevelt como sendo “um lugar seguro e agradável, logo ao norte
de Casablanca”. E com sua queda especial para batizar as coisas,
propôs que o codinome da reunião fosse Symbol
– escolha bem mais acertada do que o codinome que, por motivos de
segurança, o Presidente selecionara para si próprio: “Almirante
Q”.
[...]
Foram
necessários cinco dias e meio para que surgisse uma área de
concordância. A abertura oficial da conferência deu-se no dia 13 de
janeiro. No dia 17 o diário de Alanbrooke [general britânico]
registrava: “Um dia terrível. Estamos mais longe do que nunca para
chegar a um acordo”. E no dia 18: “De 10h30 min às 13 horas uma
reunião muito agitada dos Chefes do Estado-Maior Conjunto; parece
que não fizemos nenhum progresso”. Por trás da discussão havia
temor... temor justificável, de parte a parte. Os meses
controvertidos de 1942 haviam confirmado na cabeça dos americanos a
suspeita de que não só o interesse dos ingleses concentrava-se no
ocidente, isto é, revelavam pouco interesse pelo oriente, como
também que não continuariam a compartilhar da luta contra o Japão,
depois de derrotada a Alemanha. Por sua vez os ingleses achavam que
os líderes políticos e militares dos Estados Unidos já estavam com
a atenção mais voltada para o Pacífico do que para a Europa, e que
esta tendência poderia se tornar irreversível. Cada lado dispunha
de indícios suficientes para alimentar os respectivos temores.
[...]
“A
exposição de Churchill em “A
Segunda Guerra Mundial”
a respeito de Casablanca é parcial e superficial; errou visivelmente
ao escrever que “as divergências não decorriam da diferença de
nacionalidades, pois restringiam-se principalmente aos Chefes do
Estado-Maior Conjunto e aos planejadores”. As divergências
surgiram por causa da diferença entre os interesses nacionais de
cada país e suas respectivas posições veiculados pelos próprios
Chefes de Estado-Maior em antagonismo ostensivo. De qualquer maneira,
às 17h30 min daquela tarde Churchill encontrou-se com os Chefes do
Estado-Maior Conjunto e dirigiram-se todos para a vila ocupada por
Roosevelt; Alanbrooke foi solicitado a comunicar o resultado das
discussões. “Foi um momento difícil. Mal acabáramos de conseguir
que os Chefes de Estado-Maior americanos concordassem conosco. A
explicação saiu boa, foi aprovada pelos americanos, pelo
Presidente, pelo Primeiro-Ministro e abençoada por todos...”
[...]
“No
Extremo Oriente a reconquista da Birmânia estava prevista para 1943,
juntamente com avanços no Pacífico dentro da escala desejada pelos
ingleses. Além disto, constava do memorando a condição fundamental
de que “na opinião dos Chefes de Estado-Maior Conjunto tais
operações devem ser conduzidas dentro de limites que não venham a
prejudicar a capacidade das Nações Unidas de aproveitar qualquer
oportunidade que surja para impor à Alemanha uma derrota decisiva em
1943”. Ao chegar a este acordo a conferência de Casablanca fez a
estratégia anglo-americana retornar às bases que haviam sido
fixadas, pela primeira vez, na reunião de Washington, logo depois de
Pearl Harbor.
É
importante observar que não há no documento nenhuma referência à
“rendição incondicional”. A primeira vez que o mundo ouviu esta
expressão, como que caracterizado um objetivo de guerra
anglo-americano, foi em uma entrevista à imprensa no dia 24 de
janeiro, quando Roosevelt observou:
Alguns
ingleses conhecem a velha história – tivemos um general chamado
U.S. Grant. Seu nome era Ulysses Simpson Grant, mas quando eu e o
Primeiro-Ministro éramos jovens este general também foi citado como
“Unconditional
Surrender”
(rendição incondicional) Grant. A eliminação da máquina bélica
alemã, japonesa e italiana significa a rendição incondicional da
Alemanha, Japão ou Itália. O que representa também uma garantia
razoável de paz mundial futura. Não significa a destruição da
população da Alemanha, Japão ou Itália, mas representa a
destruição da filosofia desses países, baseada na conquista e
domínio de outros povos.
Esta
reunião poderia ser denominada de reunião da ‘rendição
incondicional’.”
Churchill
endossou a declaração de Roosevelt no ato. Na obra “A
Segunda Guerra Mundial”
seu relato sobre as origens da declaração ficou contrafeito e
evasivo. Depois da guerra, sua declaração perante a Câmara dos
Comuns de que “de forma alguma a expressão ‘rendição
incondicional’ foi submetida à minha apreciação antes de ser
pronunciada pelo nosso grande amigo, nosso ilustre e poderoso aliado
Presidente Roosevelt” pode ser atribuída seja a um lapso de
memória de um homem idoso, seja a uma imprecisão semântica. Porque
os fatos são claros e estão documentados. Muito antes de
Casablanca, em uma reunião com os seus Chefes de Estado-Maior no dia
7 de janeiro, o próprio Roosevelt declarara que pretendia apoiar a
rendição incondicional como uma prioridade dos aliados.”
pp.
207-209, 212-215
Fonte:
LEWIN, Ronald. Churchill
– o Lorde da Guerra.
Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1979.
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seleção: LdeM
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