segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Relações do Papado com o Nazi-Fascismo / c3





Relações do Papado com o Nazismo – continuação 3


fonte: CORNWELL, John. O Papa de HitlerA História Secreta de Pio XII.

Após a encíclica e a Noite dos Cristais

Após a encíclica Mit brennender Sorge [1937] o clero católico alemã manteve um período de críticas e resistências, mas acabou por se silenciar – pelo menos publicamente – pois acreditavam que manter a submissão era o 'preço da sobrevivência' e que melhor manter os cultos e organizações católicas do que enfrentar o totalitarismo nazista. O regime hitlerista chegara a se intrometer em assuntos de ordem religiosa – até criando um órgão governamental [Ministério de Assuntos Religiosos] para tanto, em contradição com a concordata .

Não houve protestos claros do Vaticano ou da hierarquia alemã depois da Kristallnacht [Noite dos Cristais, 09 de novembro de 1938]. E, no entanto, Pacelli reivindicara para si mesmo e para a Santa Sé uma posição de elevada coragem moral, no início do ano, quando dissera à multidão de fiéis no Congresso Eucarístico, em Budapeste, assim como para o mundo em geral: […]

A política de Pacelli, como já ressaltamos, era de silêncio público e indiferença particular na questão judaica. Como a correspondência entre a hierarquia alemã e o gabinete de Pacelli demonstrou em inúmeras ocasiões, a atitude era a seguinte: os judeus devem cuidar de si mesmos. Contudo, há indicações de que Pio XI começou a assumir uma posição mais simpática, embora restrita, sobre a terrível situação dos judeus, à medida que os acontecimentos se sucederam.” p. 208


O que tornava extremamente difícil o protesto público dos católicos, num nível local, como esta narrativa tem reiterado, era a política de supremacia papal centralizadora, que enfraqueceu o catolicismo político ao longo de duas décadas. Durante um período crítico nas décadas de 1920 e 1930, quando os partidos católicos – o Partido popular, na Itália, e o Partido do Centro na Alemanha – eram de fato a única opção para o eleitorado do centro democrata cristão, o vaticano preferiu repudiá-los, apoiada pela Igreja 9como ocorreu com o Solidariedade, na Polônia, nas décadas de 1970 e 1980), não podia (pois) havia uma resistência viável e eficaz.

A imensa tragédia da abdicação do catolicismo político pode ser vislumbrada pela consideração de dois exemplos de protesto católico, um antes e outro durante a guerra: as reações à retirada dos crucifixos, em 1936, e ao programa de 'eutanásia', em 1941. Se esses protestos fossem repetidos e se estendessem numa multiplicidade de exemplos locais por toda a Alemanha, de 1933 em diante, a história do regime nazista poderia ter seguido por um curso diferente. Se os católicos protestassem, em termos mais específicos, contra a Kristallnacht (Noite dos Cristais) e o crescimento do anti-semitismo, o destino dos judeus na Alemanha nazista e por toda a Europa poderia ser diferente. Esta foi a conclusão de pelo menos três eminentes historiadores do período: Nathan Stoltzfus, J.P. Stern e Guenter Lewy. 'Parece acima e além de qualquer dúvida que se as igrejas se opusessem à matança e à perseguição dos judeus, como se opuseram à execução dos que tinham insanidade e doenças congênitas, não teria havido a Solução final', escreve Stern.” (pp. 217-18)

A morte do Papa Pio XI – que se apresentava declaradamente contra o racismo e o totalitarismo, principalmente o nazismo – foi motivo de alegria para os ditadores. Tanto Mussolini quanto Hitler tinha agora um 'velho amigo' para ousarem mais negociações para garantir o poder na Europa. Pio XI considerava os líderes ingleses e franceses muito fracos e lentos para deterem a maré fascista – ainda mais depois da vergonha de Munique, quando o destino trágico da Tchecoslováquia foi selado.

O conclave de 1º – 2 de março de 1939, depois da morte de Pio XI, a 10 de fevereiro, foi um evento de crítico significado internacional numa época de conflito iminente entre as grandes potências. Pio XI acabara falando abertamente contra o regime na Alemanha, com sua encíclica Mit brennender Sorge, em 1937. além disso, seu relacionamento com a Itália fascista chegara ao máximo de deterioração por ocasião de sua morte. Apesar disso, o Tratado de Latrão e a Concordata do Reich ainda persistiam. Um novo papa, se fosse pró-Hitler e pŕo-Mussolini, poderia consolidar o eixo Roma-Berlim dos ditadores, proporcionando-lhes um estímulo de apoio moral aos olhos do mundo. Por outro lado, ele poderia permanecer neutro, um 'homem de oração', um papa pastoral que se recusasse a falar por qualquer lado; ou poderia se pôr do lados das democracias e encorajar a opinião pública americana a apoiar a França e a Inglaterra no conflito iminente.” (p. 226)

Quando Pacelli assumiu o trono do Vaticano com o título de Pio XII, ele manteve a aprovação ao Herr Hitler, ao qual enviou carta, com o intuito de 'manter os vínculos diplomáticos'. É de se pensar se Pio XII aprovava Hitler ou temia alguma retaliação do Führer. “Desde o início de seu pontificado, portanto, que o tratamento dispensado por Pacelli a Hitler ultrapassava a cortesia da diplomacia. Seus bispos alemães seguiram a deixa. Sua carta excepcionalmente cordial para o 'ilustre Hitler' cruzou com a chegada dos 'cumprimentos mais efusivos do Führer e seu governo'.” (pp. 230-31)


No momento mesmo em que a multidão se concentrava diante da Basílica de São Pedro, 40 divisões alemãs haviam se mobilizado e chegavam informações sobre movimentação de tropas da Wehrmacht na fronteira tcheca, preparando-se para o avanço até Praga.” (p. 232)

Ao contemplar as forças poderosas que se concentravam para a guerra, Pacelli podia invocar a lealdade e devoção de meio bilhão de almas – por exemplo, metade da população do novo Grance Reich de Hitler era de católicos, inclusive um quarto da SS - e isto numa ocasião em que bispos, padres, religiosos e fieis tinham uma unidade de disciplina sem precedentes. Pacelli não tinha exércitos para mobilizar, mas meio século de crescente autoridade papal centralizadora lhe proporcionavam uma extraordinária influência sobre os corações e mentes dos fieis católicos. O papa, por sua própria avaliação, era o supremo árbitro dos valores morais no mundo, em consequência, suas responsabilidades eram ainda mais excepcionais. Com a instituição do papado, com Pacelli, o homem que personificava esta instituição, enfrentariam os desafios à frente, os mais extraordinários desafios na longa história da Igreja?” (p. 237)


fonte: CORNWELL, John. O Papa de HitlerA História Secreta de Pio XII.



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para a cerimônia de coroação de Pio XII




Seleção / comentários : LdeM


 

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Conferência de Casablanca - janeiro 1943




Conferência de Casablanca
14 – 24 janeiro 1943

era uma felicidade o fato de estar próxima a realização de uma conferência de cúpula, considerada indispensável não só para unificar a estratégia anglo-americana no ocidente, mas igualmente indispensável para a elaboração de uma doutrina comum no oriente."


"Roosevelt [presidente dos Estados Unidos da América] tinha plena consciência desta necessidade. Na verdade, a reunião de Casablanca originou-se de um telegrama por ele endereçado a Churchill [ primeiro-ministro britânico] em 26 de novembro. Dizia: “Acho que devemos convocar uma conferência militar sobre estratégia entre a Grã-Bretanha, a União Soviética e os Estados Unidos, tão logo expulsemos os alemães da Tunísia”. Rápida e sabiamente Churchill alçou a ideia para um escalão mais elevado, recomendando não apenas a reunião entre os estados-maiores, mas sim entre os lideres: “Em Moscou Stalin [ditador soviético] deu-me a entender que gostaria de encontrar-se com o senhor e comigo em algum lugar, neste inverno; mencionou a Islândia.” Entretanto, no momento Stalin não pensava em afastar-se da União Soviética, pois a batalha de Stalingrado atravessava uma fase crítica; como consequência, procedeu-se a uma reunião anglo-americana com a participação do Primeiro-Ministro, do Presidente e dos Chefes do Estado-Maior Conjunto, em local que Churchill descrevera para Roosevelt como sendo “um lugar seguro e agradável, logo ao norte de Casablanca”. E com sua queda especial para batizar as coisas, propôs que o codinome da reunião fosse Symbol – escolha bem mais acertada do que o codinome que, por motivos de segurança, o Presidente selecionara para si próprio: “Almirante Q”.
[...]
Foram necessários cinco dias e meio para que surgisse uma área de concordância. A abertura oficial da conferência deu-se no dia 13 de janeiro. No dia 17 o diário de Alanbrooke [general britânico] registrava: “Um dia terrível. Estamos mais longe do que nunca para chegar a um acordo”. E no dia 18: “De 10h30 min às 13 horas uma reunião muito agitada dos Chefes do Estado-Maior Conjunto; parece que não fizemos nenhum progresso”. Por trás da discussão havia temor... temor justificável, de parte a parte. Os meses controvertidos de 1942 haviam confirmado na cabeça dos americanos a suspeita de que não só o interesse dos ingleses concentrava-se no ocidente, isto é, revelavam pouco interesse pelo oriente, como também que não continuariam a compartilhar da luta contra o Japão, depois de derrotada a Alemanha. Por sua vez os ingleses achavam que os líderes políticos e militares dos Estados Unidos já estavam com a atenção mais voltada para o Pacífico do que para a Europa, e que esta tendência poderia se tornar irreversível. Cada lado dispunha de indícios suficientes para alimentar os respectivos temores.


[...]


A exposição de Churchill em “A Segunda Guerra Mundial” a respeito de Casablanca é parcial e superficial; errou visivelmente ao escrever que “as divergências não decorriam da diferença de nacionalidades, pois restringiam-se principalmente aos Chefes do Estado-Maior Conjunto e aos planejadores”. As divergências surgiram por causa da diferença entre os interesses nacionais de cada país e suas respectivas posições veiculados pelos próprios Chefes de Estado-Maior em antagonismo ostensivo. De qualquer maneira, às 17h30 min daquela tarde Churchill encontrou-se com os Chefes do Estado-Maior Conjunto e dirigiram-se todos para a vila ocupada por Roosevelt; Alanbrooke foi solicitado a comunicar o resultado das discussões. “Foi um momento difícil. Mal acabáramos de conseguir que os Chefes de Estado-Maior americanos concordassem conosco. A explicação saiu boa, foi aprovada pelos americanos, pelo Presidente, pelo Primeiro-Ministro e abençoada por todos...”
[...]


No Extremo Oriente a reconquista da Birmânia estava prevista para 1943, juntamente com avanços no Pacífico dentro da escala desejada pelos ingleses. Além disto, constava do memorando a condição fundamental de que “na opinião dos Chefes de Estado-Maior Conjunto tais operações devem ser conduzidas dentro de limites que não venham a prejudicar a capacidade das Nações Unidas de aproveitar qualquer oportunidade que surja para impor à Alemanha uma derrota decisiva em 1943”. Ao chegar a este acordo a conferência de Casablanca fez a estratégia anglo-americana retornar às bases que haviam sido fixadas, pela primeira vez, na reunião de Washington, logo depois de Pearl Harbor.


É importante observar que não há no documento nenhuma referência à “rendição incondicional”. A primeira vez que o mundo ouviu esta expressão, como que caracterizado um objetivo de guerra anglo-americano, foi em uma entrevista à imprensa no dia 24 de janeiro, quando Roosevelt observou:


Alguns ingleses conhecem a velha história – tivemos um general chamado U.S. Grant. Seu nome era Ulysses Simpson Grant, mas quando eu e o Primeiro-Ministro éramos jovens este general também foi citado como “Unconditional Surrender” (rendição incondicional) Grant. A eliminação da máquina bélica alemã, japonesa e italiana significa a rendição incondicional da Alemanha, Japão ou Itália. O que representa também uma garantia razoável de paz mundial futura. Não significa a destruição da população da Alemanha, Japão ou Itália, mas representa a destruição da filosofia desses países, baseada na conquista e domínio de outros povos.
Esta reunião poderia ser denominada de reunião da ‘rendição incondicional’.”


Churchill endossou a declaração de Roosevelt no ato. Na obra “A Segunda Guerra Mundial” seu relato sobre as origens da declaração ficou contrafeito e evasivo. Depois da guerra, sua declaração perante a Câmara dos Comuns de que “de forma alguma a expressão ‘rendição incondicional’ foi submetida à minha apreciação antes de ser pronunciada pelo nosso grande amigo, nosso ilustre e poderoso aliado Presidente Roosevelt” pode ser atribuída seja a um lapso de memória de um homem idoso, seja a uma imprecisão semântica. Porque os fatos são claros e estão documentados. Muito antes de Casablanca, em uma reunião com os seus Chefes de Estado-Maior no dia 7 de janeiro, o próprio Roosevelt declarara que pretendia apoiar a rendição incondicional como uma prioridade dos aliados.”
pp. 207-209, 212-215


Fonte: LEWIN, Ronald. Churchill – o Lorde da Guerra. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1979.


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Batalha de Stalingrado

 

seleção: LdeM

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Thomas Mann - Discurso contra Hitler - jan 1943




Discurso de Thomas Mann

BBC
Discursos contra Hitler


15 de janeiro de 1943


Ouvintes alemães!


Vai começar o jubileu sombrio: dez anos de nacional-socialismo. O que esses anos trouxeram ao povo alemão? Só há uma resposta, uma resposta que diz tudo: a guerra, essa guerra, tal como a vemos hoje e tal como terminará para o povo alemão. A guerra de Hitler, que mata os filhos de vocês aos milhões e vai fazer do continente – incluindo a Alemanha – um deserto. Esse é o único fato que podemos mencionar quando somos perguntados pelos acontecimentos dessa década. Tudo, desde o começo, apontava para essa guerra, tudo caminhava em sua direção. Todo o resto, seja qual for seu nome mentiroso, a começar pelo próprio nome mentiroso do movimento nacional-socialista, nada mais era que preparação e restauração sistemática para a aventura sem saída dessa guerra que o líder de vocês certamente imaginou de forma diferente da que se vê agora: uma batalha desesperadora em que a Alemanha tem de acumular um crime inexpiável atrás de outro e cujas consequências físicas e morais ela terá de pagar ninguém sabe por quanto tempo.


Todos os pretensos ganhos que o regime conquistou para a Alemanha mostram seu verdadeiro rosto sob a luz desse resultado. Eles se provaram absurdos, mesmo para aqueles que desgraçadamente alguma vez viram aí outra coisa que não fraude, loucura e infâmia. Diz-se que Hitler libertou a Alemanha do desemprego. Sim – através do armamento para a guerra. Nacional-socialismo: ou seja, a solução das questões sociais através da guerra. Diz-se que ele unificou a Alemanha como nunca antes e concretizou o socialismo na medida em que criou uma comunidade popular. Essa comunidade popular era a ditadura da plebe, um horrível terror partidarista que trouxe consigo devastação moral, deterioração humana, violação da consciência, destruição dos laços naturais e mais respeitáveis, como nunca antes um povo vivenciou, e que se amparou em tudo, menos naquilo que é bom no ser humano. Hoje, o aspecto dessa comunidade popular é tal que 700 mil pretorianos pesadamente armados precisam manter sob controle não só o povo ávido por paz, mas também o extenuado Exército Popular.


E o socialismo? Ele é o enriquecimento dos próprios bonzos, a transformação do Partido Nazista em um enorme conglomerado econômico, gordo como Göring. Ele consiste, além disso, na estimulante instituição da “Força pela Alegria”, isto é, no transporte de massas de trabalhadores destituídos de seus direitos para belas regiões. Mas o nacional-socialismo não limpou o país da corrupção republicana e não recuperou a Alemanha da vergonha e da ignomínia aos olhos do mundo, restaurando sua honra? Não há uma só criança na Alemanha que não saiba que, comparadas à corrupção revoltante do domínio nazista, as pequenas inépcias morais da República, infladas por processos imprudentes, eram a própria inocência.


E a honra alemã? A dignidade da ciência foi arruinada, todo e qualquer sentimento de justiça pisoteado, o juiz alemão reduzido a um moleque de recados do Partido, a palavra alemã transformada em deboche através de quebras de acordo e promessas rasgadas, através da infame concepção da política como uma esfera do absoluto cinismo; o nome da Alemanha foi transformado na quintessência de todo o terror, de toda vicejante avidez pelo roubo, de toda crueldade vergonhosa, de toda violência sem compaixão, de maneira que a memória dos povos quanto a tudo aquilo de bom, grande e digno de ser amado que o espírito alemão trouxe outrora à humanidade ameaça sucumbir em um mar de ódio, cujas ondas que avançam impetuosas vocês tentam deter com um esforço desesperado, com “Força pelo Medo”, para não serem por elas tragados. É essa a honra alemã recuperada. É esse o balanço de dez anos de nacional-socialismo. E eu estou contente por me serem dados apenas cinco ou seis minutos para fazê-lo. A história será mais minuciosa.”


pp. 123-125


Fonte: MANN, Thomas. Ouvintes Alemães! Discursos contra Hitler (1940-1945). Rio de Janeiro: Zahar, 2009.


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seleção: LdeM

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Stalingrado 1942-1943 - o VI Exército alemão é cercado e derrotado




Stalingrado / 1942-1943

O VI Exército alemão é cercado e derrotado

A notícia espalhou-se rapidamente pelo lado alemão com a frase: “Estamos cercados!” Aquele domingo, 22 de novembro, era o dia de finados para os protestantes. “Um sombrio Totensonntag 1942”, escreveu Kurt Reuber, sacerdote servindo como médico na 16ª Divisão de panzers, “preocupação, medo e horror.” Muitos, contudo, não ficaram demasiado preocupados ao ouvirem pela primeira vez a noticia. Cercos haviam ocorrido, e sido rompidos, no inverno anterior, porém os oficiais mais vem-informados, após refletir melhor, começaram a perceber que desta vez não havia mais reservas para socorrê-los logo.

-Ficamos muito conscientes do perigo em que nos encontrávamos – lembrou Freytag-Loringhoven [capitão, comandante de esquadrão] -, isolados em tão grande profundidade na Rússia, na fronteira da Ásia.

Quase sessenta e cinco quilômetros a oeste, o último bolsão de resistência romena chegava ao fim, embora nas primeiras horas daquele dia o general Lascar rejeitasse a exigência de render-se do Exército Vermelho. “Continuaremos a lutar sem pensar em nos entregar”, declarou, mas suas tropas, embora resistissem bravamente, ficaram sem suprimentos e munição. ”
p. 293-94

A retirada alemã a leste do Don , de volta para Stalingrado e longe do resto da Wehrmacht, foi em muitos aspectos pior que a retirada diante das portas de Moscou, em dezembro anterior. A neve fina, pesada e seca lançava-se pela estepe, açoitando-lhes o rosto, por mais que levantassem a gola para proteger-se do frio. Apesar das amargas lições do ano anterior, muitos soldados ainda não haviam recebido uniformes de inverno. As linhas de retirada estavam cobertas de armas, capacetes e equipamento abandonados. [...] de vez em quando, havia ondas de pânico, com gritos de ‘Tanques russos!’. O 16º corpo de Tanques soviético atacava a 76ª Divisão de Infantaria em direção a Vertiachi, ameaçando isolar as unidades alemãs deixadas a oeste do Don.” p. 296

O triunfo não suavizou a atitude dos homens do Exército Vermelho para com o inimigo. “sinto-me muito melhor porque começamos a destruir os alemães”, escreveu um soldado à mulher em 26 de novembro. “Foi o momento em que começamos a golpear as cobras. Estamos capturando muitas. Mal temos tempo para passá-los a campos de prisioneiros. Agora eles começaram a pagar pelo nosso sangue e pelas lágrimas do nosso povo, pelos insultos e pelo roubo. Recebi uniforme de inverno, portanto não se preocupe comigo. As coisas vão bem aqui. Logo estarei em casa após a vitória. Mando 500 rublos.” Os hospitalizados, que se recuperavam de ferimentos recebidos antes, lamentavam amargamente perder o combate. “As batalhas são fortes e boas agora”, escreveu um soldado russo à mulher, “e eu aqui deitado, perdendo tudo isso.” “ pp. 300-01

Paulus [comandante do VI Exército alemão], após o estudo da campanha de 1812, ficou, claro, obcecado com a visão da desintegração do seu exército fragmentado, quando tentasse escapar pela estepe coberta de neve. Não queria entrar na história como o general responsável pelo maior desastre militar de todos os tempos. Jamais celebrizado pela independência de pensamento, também deve ter sido tomado pela natural tentação de acatar decisões política e estrategicamente perigosas, agora que sabia que o marechal-de-campo von Manstein ia em breve assumir o comando. Mas Manstein, sem poder vir do norte de avião por causa do mau tempo, achava-se emperrado no trem do seu quartel-general, atrasado por ação de partisans [guerrilheiros anti-nazistas].” p. 307

Às dez e quinze daquela noite [22 de novembro], Paulus recebeu uma mensagem de rádio do Führer [o ditador nazista]. “O Sexto Exército está temporariamente cercado por forças russas. Conheço o Sexto Exército e seu comandante-em-chefe e não tenho a menor dúvida de que nessa situação difícil resistirão bravamente. O Sexto Exército precisa saber que estou fazendo tudo para aliviá-los. Enviarei minhas instruções a tempo. Adolf Hitler.” Paulus e Schmidt, convencidos de que apesar dessa mensagem, Hitler logo cairia em si, começaram a preparar planos para uma retirada à força para o sudoeste.” p. 309

Hitler deu rigorosas instruções para que se escondesse do povo alemão a notícia do cerco. Em 22 de novembro, o comunicado admitia que houvera um ataque na frente norte. No dia seguinte, logo após o cerco completo do Sexto Exército, informaram-se apenas os contra-ataques e as baixas inimigas. Um anúncio posterior dava a impressão de que os ataques soviéticos haviam sido revidados com intensas baixas. Por fim, em 8 de dezembro, três semanas após o ocorrido, ficou-se sabendo que também houvera um ataque ao sul de Stalingrado, mas ainda sem nenhuma insinuação de que o Sexto Exército fora isolado. Manteve-se a ficção até janeiro com a fórmula vaga ‘as tropas na área de Stalingrado’.” p. 314

Com o Sexto exército reduzido a condições muito semelhantes às da Primeira Guerra Mundial, os soldados mais velhos viram-se lembrando a existência da Frente Ocidental e seu humor negro. Após o frio de meados de novembro, instalou-se um úmido período de degelo, com o ‘general Lama’ reaparecendo brevemente perante o ‘general Inverno’. [...]” p. 323

Muitos soldados ainda não tinham recebido enxoval de inverno adequado antes do cerco, por isso recorriam à improvisação com variado grau de sucesso. Sob os uniformes, um número cada vez maior usava peças de uniforme soviético – camisas tipo túnica sem botão, calças e as muito valorizadas jaquetas acolchoadas. Nas geadas intensas, um capacete de aço tornava-se quase um compartimento de freezer, por isso eles punham perneiras, cachecóis e até ataduras de pé russas enroladas em volta da cabeça como vedação. O desespero por luvas levou-os a matar vira-latas para esfolá-los. Alguns chegaram mesmo a tentar fazer túnicas de couro de cavalo curado por processos amadorísticos, mas a maioria dessas peças ficava desconfortavelmente grosseira, a não ser quando se subornava um antigo fabricante de selas ou sapateiro para ajudar.” p. 325

Stalin, enquanto isso, estivera esperando um segundo golpe decisivo, quase logo depois do cerco ao Sexto Exército. A Operação Urano fora considerada na Stavka a primeira parte de uma estratégia de mestre. A segunda, e mais ambiciosa fase, seria a Operação Saturno. Estabelecia uma ofensiva repentina pelos exércitos das Frentes Sudoeste e Voronej, esmagando todo o Oitavo Exército italiano a fim de avançar pelo sul para Rostov. A ideia era isolar o resto do Grupo do Exército do Don e cercar o Primeiro Exército de panzers e o 17ª Exército no Cáucaso.” pp. 334-35

Também em 3 de dezembro, Hoth [general alemão] apresentou sua proposta para a ‘Tempestade de Inverno’, que assim começava: ‘Intenção: Quarto Exército de panzer alivia o Sexto Exército’, mas perdeu-se valioso tempo. A 17ª Divisão de panzers, que completaria sua força de ataque, fora mantida recuada por ordens do quartel-general do Führer, como uma reserva atrás do Oitavo Exército italiano. No fim, só conseguiu juntar-se à força de Hoth quatro dias depois do início da operação. No entanto, Hitler insistiu em que não se perdesse mais tempo. Também ficou impaciente por descobrir como se desempenharia o tanque Tigre, com seu canhão de 88 mm. O primeiro batalhão a ser formado avançara às pressas para Ostfront e somou-se à força de Kirchner. No entardecer de 10 de dezembro, os comandantes receberam a ‘Ordem para o Ataque de Socorro a Stalingrado’.

Em 12 de dezembro, após um breve bombardeio de artilharia, os panzers de Hoth atacaram ao norte. Os soldados alemães dentro do Kessel [bolsão] ouviram ansiosos o barulho do combate distante. A confiança parecia sem limites. Rumores exaltados circularam pelo Sexto Exército.

-Manstein está chegando! [der Manstein kommt!] – diziam os soldados uns aos outros, quase como a saudação de Páscoa da Igreja ortodoxa.
Para os leais ao Führer, os distantes tiros de canhões eram a prova de que o Führer sempre cumpria a palavra.

Hitler, contudo, não tinha a menor intenção de permitir que o Sexto Exército rompesse o cerco. Em sua conferência do meio-dia na Wolfsschanze [Covil do lobo], disse a Zeitzler [ oficial do Q-G] que era impossível retirar-se de Stalingrado, porque isso implicava sacrificar ‘todo o sentido da campanha’, e afirmou que já se derramara sangue demais. Como [o general] Kluge advertira Manstein, ele continuava obcecado com os acontecimentos do inverno anterior e sua ordem ao Grupo Centro do Exército que aguentasse. ‘Assim que uma unidade se põe a fugir’, pregou um sermão ao chefe do estado-maior do exército, ‘os compromissos de lei e ordem logo desaparecem no curso da fuga.’ “ pp. 339-40


Em 16 de dezembro, transcorridos apenas quatro dias da ofensiva de Hoth, os 1º e 3º Exércitos da Guarda, além do 6º Exército soviético, mais acima no Don, atacaram pelo sul. Retardada pelo nevoeiro denso e glacial, com suas formações de tanque avançando às cegas em campos minados, a operação soviética não deu a partida com bom início. Contudo em dois dias o Oitavo Exército italiano desabara após alguns atos de feroz resistência. Não havia nenhuma reserva com que contra-atacar, agora que a 17ª Divisão de panzers se juntara à operação de Hoth a leste do Don, por isso as colunas de tanques soviéticas irromperam ao sul na estepe aberta e coberta de neve. O grande congelamento da região, iniciado em 16 de dezembro, pouco contribuiu para diminuir a velocidade das brigadas de T-34, que avançavam causando violentos distúrbios na retaguarda do Grupo do Exército do Don. Os entroncamentos e as estações ferroviários foram capturados logo depois que as tropas alemãs, antes de fugirem, atearam intenso fogo nos vagões cheios de equipamento.” p. 342

O primeiro cerco de um grande exército alemão encurralado longe de casa, com ordens de manter-se firme e no fim abandonado à sua sorte, criou, claro, um intenso debate com o passar dos anos. Muitos participantes e historiadores alemães culparam Paulus por não ter desobedecido às ordens e rompido o cerco. Mas se havia alguém em posição de dar a Paulus, privado de informação vital, uma ideia sobre a questão, este deveria ser seu superior imediato, o marechal-de-campo von Manstein.

Pode-se servir a dois senhores?”, anotou Strecker quando Hitler rejeitou a Operação Trovão, o plano de romper o cerco para acompanhar a Operação Tempestade de Inverno. Mas i Exército alemão só tinha um único senhor. O comportamento servil, desde 1933, da maioria dos oficiais superiores deixara-o ao mesmo tempo desonrado e impotente em termos políticos. De fato, o desastre e a humilhação de Stalingrado foram o preço que o exército teve de pagar por seus arrogantes anos de privilégio e prestígio sob a cobertura de proteção nacional-socialista. Não havia escolha alguma de senhor, além de juntar-se ao grupo em torno de Henning von Tresckow e Stauffenberg [grupo de conspiradores no Exército que desencadearam a Operação Valkyrie em julho de 1944, e foram mal sucedidos].

Muito tempo tem sido gasto no debate sobre se era factível uma ruptura de cerco na segunda metade de dezembro, embora até os comandantes de panzers admitissem que ‘as chances de uma ruptura bem-sucedida diminuíam com o passar de cada semana”. A infantaria tinha menos ilusões ainda. [...]” pp. 351-52


Cedo na manhã de 3 de janeiro, Paulus foi à 44ª Divisão de Infantaria, ‘acompanhar as transmissões de rádio feitas por prisioneiros da 44ª Divisão de Infantaria’. Eles haviam falado da escassez de comida e munição e das pesadas baixas, ‘O comandante-em-chefe’, afirmou o comunicado do Sexto Exército, ‘queria que se fizessem advertências sobre as consequências da participação nessas transmissões. Todos os soldados que fizessem isso deviam compreender que seus nomes seriam conhecidos e que eles enfrentariam uma corte marcial. ‘Durante o encontro de Paulus com o general-de-divisão Deboi, houve outro ‘intenso ataque com tanques’.” p. 363

A tensão das tripulações aéreas da Luftwaffe era intensa. ‘AS tripulações jovens e inexperientes ficavam terrivelmente abaladas’ com as cenas em Pitomnik, acima de tudo com a infeliz condição dos feridos ao lado da pista à espera de evacuação e com as pilhas de cadáveres congelados ali deixados pelo hospital de campanha porque o terreno estava congelado demais para enterrá-los.” p. 380

O general Hube, quando retornou ao Kessel [bolsão] em 9 de janeiro, véspera da ofensiva soviética, disse a Paulus e Schmidt que Hitler simplesmente se recusava a aceitar a possibilidade de derrota em Stalingrado. Não ouvia seu relato sobre as condições no Kessel e, em vez disso, tentara convencê-lo de que uma segunda tentativa de socorro bem poderia se apresentar.” p. 389

Embora Hube fosse um dos comandantes preferidos de Hitler, sua evidente crença de que o Sexto Exército estava condenado apenas confirmava a desconfiança de Hitler de que todos os generais se achavam contagiados pelo pessimismo. Paulus reconheceu isso. Chegou à conclusão de que só um jovem guerreiro altamente condecorado poderia atrair as ideias românticas de Hitler e desse modo ficar em melhor posição de convencê-lo a ouvir a verdade.” pp. 389-90

O Führer agora queria, fosse qual fosse o desfecho, um exemplo heroico para o povo alemão. Em 15 de janeiro, conferiu a Paulus as Folhas de Carvalho para sua Cruz de Cavaleiro e anunciou 178 outras importantes condecorações a membros do Sexto Exército. Muitos agraciados continuavam não reconhecendo como essas honras eram facas de dois gumes.” p. 395

A Operação Koltso, ou ‘Círculo’, começou no início de domingo, 10 de janeiro. Rokossovski e Voronov estavam no quartel-general do 65º Exército quando se deu a ordem de ‘Disparar!’ pelo rádio às 6:05h da manhã, horário alemão. Os canhões rugiram, saltando nas conteiras. Os foguetes Katiusha silvavam no céu, deixando densas trilhas de fumaça. As 7 mil peças de campanha, lançadores e morteiros continuaram durante cinquenta e cinco minutos no que Voronov descreveu como ‘um incessante estrondo de trovão’.” p. 402

A resistência do Sexto Exército, quando se leva em consideração sua fraqueza física e material, foi espantosa. A medida mais reveladora está nas baixas que infligiu durante os três primeiros dias. A Frente do Don perdeu 26 mil homens e mais da metade de sua força de tanques. Os comandantes soviéticos fizeram poucas tentativas de reduzir as baixas. Seus homens ofereciam alvos fáceis avançando na linha ampliada. Torrões marrons de mortos russos juncavam a estepe coberta de neve. (os uniformes de camuflagem brancos eram reservados sobretudo às companhias de reconhecimento e aos franco-atiradores). A raiva dos soldados e oficiais russos era descarregada em cima dos seus prisioneiros alemães, esqueléticos e infestados de piolhos. Alguns eram fuzilados ali mesmo. Outros morriam quando eram conduzidos marchando em pequenas colunas, e os soldados soviéticos pulverizavam-nos com fogos de metralhadora. Num caso, o comandante ferido de uma companhia shtraf [formadas por prisioneiros, geralmente presos políticos] obrigou um oficial alemão a ajoelhar-se diante dele na neve, gritou os motivos pelos quais ele queria vingança e deu-lhe um tiro.” p. 406


Mais sobre as companhias shtraf em


Fonte: BEEVOR, Antony. Stalingrado – O Cerco Fatal. Rio de Janeiro: Record, 2005.



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quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

A Retirada do Afrika Korps - 1942-1943

 


A Retirada do Afrika Korps

Após a derrota na Segunda Batalha de El Alamein

1942-1943

Rommel [General alemão] não tinha dúvidas sobre a inevitabilidade da retirada para a Linha Mareth, onde esta fechava os caminhos de acesso à Tunísia pelo sul, pois era evidente que Montgomery [General britânico] só para acumular suprimentos suficientes par leva-lo até Tripoli. Em Mareth, com forças intactas, Rommel tinha possibilidade de realizar uma defesa prolongada, embora entre aquele local e Agheila, certas posições talvez pudessem oferecer tréguas temporárias. Quanto ao AK [Afrika Korps], as confabulações havidas entre seu comandante e os Comandos Superiores não foram reveladas, embora os boatos de que recursos estavam sendo despejados na Tunísia provocassem comentários sardônicos. Tivessem eles sabido que Hitler e Mussolini haviam decidido defender El Agheila por motivos puramente políticos, sem considerar o inevitável sacrifício do AK, e sua reação, sem dúvida, teria sido diferente.

Acontece que Rommel ludibriou os políticos, à perigosa moda antiga e no último minuto. A 11 de dezembro, o 8º Exército avançou para Mersa Brega enviou poderosa força móvel para contornar o flanco do deserto – sua meta era o Arco de Mármore (Marble Arch), na retaguarda do AK. As lentas divisões de infantaria não-motorizadas italianas já haviam sido mandadas de volta (a despeito da ordem de imobilidade dada pelos ditadores) de modo que a defesa era formada apenas de forças móveis. No devido tempo, o reconhecimento aéreo comunicou a aproximação do golpe na direção do Arco de mármore, o sinal, independente de ordens contrárias, para o AK, duas divisões blindadas italianas e a 90ª Ligeira se movimentarem novamente, dirigindo-se para Buerat.

A jornada foi extraordinária. Independente das exigências táticas, as formações do Eixo que recuavam tinham de calcular todos os movimentos em relação a cada litro de gasolina. As paradas eram mais condicionadas pela escassez de combustível do que por necessidade tática, embora muitas vezes tivesse sido melhor recuar ou contra-atacar mais cedo, para aliviar parte da terrível crise. Por conseguinte, o perigo aumentava a cada atraso verificado nas partidas, e a coisa começava a ficar dispendiosa em homens e máquinas, na corrida de último minuto para escapar às forças blindadas e canhões britânicos que se avolumavam, vindos do deserto aberto para bloquear os desfiladeiros na retaguarda. O bombardeio incessante ameaçava fazer cair a confusão sobre os fugitivos. O fato de terem chegado mais ou menos em ordem a Buerat, enquanto os britânicos ‘limpavam’ um bolsão vazio perto de Nofilia, era tanto resultado de sorte e nervos fortes como também da organização adequada.

O futuro do AK agora dependia da capacidade de Rommel de evitar as mortíferas ordens de imobilidade.

A 21ª Panzer, já guardando o flanco sul em Buerat, reuniu-se a 15ª Panzer – marcando o reagrupamento temporário do AK – pois finalmente o Alto-Comando chegara à conclusão de que não era mais possível defender a Tripolitânia. Ficou acordado que a partida do grupo se realizaria segundo a rapidez do avanço de Montgomery.

Não é provável que a soldadesca do AK estivesse no conhecimento da ação diplomática de retaguarda que seu comandante travava contra a intransigência do Alto-Comando, enquanto eles defendiam essa retaguarda aos ataques dos britânicos. Quando viam Rommel, a sua atitude não deixava transparecer senão confiança. Além do mais, as dificuldades que vinham enfrentando de modo algum afetavam o prestígio do comandante, porque normalmente ele os safava e os encorajava, fazendo-os observar que só raramente os britânicos os seguiam. Agora, diante das novidades vindas da Tunísia, muitos dos soldados em Buerat partiram imediatamente para ocupar as defesas próximo de Mareth. Portanto, a marcha à ré dos italianos na direção de Tarhuna e a retirada da 21ª Panzer, a 13 de janeiro, para Gabes, militarmente faziam sentido – mais ainda porque os primeiros indícios de um ataque anglo-americano contra Mareth, vindo do norte, já tinham sido observados.

A redução do AK na Tripolitânia demonstrou, melhor do que qualquer outra coisa, que Rommel abandonara todas as operações ofensivas ali: assim, quando o 8º Exército reiniciou seu avanço, a 15 de janeiro, foi para ser envolvido num mar de minas colocadas por um inimigo que atirava e corria, e por um AK formado da 15ª Panzer (com apenas 36 tanques), a 90ª Ligeira, a 164ª Divisão e a Brigada Ramcke. Cada vez mais rápida, a retirada prosseguia, com uma ligeira pausa em Tarhuna e sem qualquer parada em Trípoli. Não obstante, o progresso britânico demonstrava o cauteloso respeito ao ferrão da cauda do AK. O avanço se fazia com cautela e por etapas, sempre tenso, à espera da resposta que, como acontecera em Buerat, podia destruir repentinamente doze tanques, com perda de apenas duas máquinas alemãs.

A 22 de janeiro, o AK despediu-se de Trípoli, dirigindo-se para a Tunísia e para a Linha Mareth, esperançoso de ali encontrar meios para montar razoável defesa, uma vez que o extenuante esforço Aliado no norte da Tunísia, contra os reforços recebidos pelos germânicos, diminuía já a força de seus golpes. Teoricamente, a Linha Mareth, construída pelos franceses, contra os italianos, antes da guerra, e apoiada em obstáculos profundos, com um flanco sul supostamente incontornável, prometia ser uma posição sólida. O melhor de tudo é que ela oferecia uma possibilidade de ser defendida com infantaria, enquanto as tropas móveis descansavam e se preparavam para operações ofensivas.


Para Rommel, porém, a velha posição francesa parecia mal situada e altamente vulnerável ao flanqueio. Preferia algo mais forte, mais ao norte e alinhado com Wadi Akarit. mas seu prestígio pessoal fora abalado, e a saúde começava a declinar. na Alemanha, seus superiores não o perdoavam por haver descumprido a ordem de não recuar. a 26 de janeiro, ele soube que seria substituído por um italiano, o General messe. sua preocupação era para com aqueles que por tanto tempo o seguiriam. "Eles me eram muito caros”, escreveu.”

pp. 123, 126-27


fonte: MACKSEY, Kenneth. Afrika Korps - Rommel no deserto. Rio de Janeiro: Renes, 1974.


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