Capítulo
XVI – Primeiro aniversário da guerra
“No
dia 22 de agosto, o movimento patriótico promoveu, em todo o país,
comemorações do primeiro aniversário da entrada do Brasil na
guerra. Contou com o apoio das emissoras de rádio dos estados, em
número de 98 estações, que prepararam programas especiais com
noticiários, crônicas cívico-patrióticas, hinos, marchas e
radioteatralização dos episódios mais marcantes daqueles dias
dramáticos de agosto de 1942. Também foi transmitida pelo DIP
[Departamento de Imprensa e Propaganda], em cadeia para todo o
Brasil, uma missa campal celebrada na praia do Roussel, com a
presença do presidente da República, ministros de Estado e demais
autoridades civis e militares. A BBC de Londres irradiou um programa
especial de saudação ao nosso povo.” (p. 191)
Segundo
aniversário da entrada dos EUA na guerra – “O movimento
patriótico preparou-se para comemorar, a 7 de dezembro de 1943, o
segundo ano da entrada dos Estados Unidos na guerra, com grandes
manifestações de massa, acobertado pelo prestígio deste país
junto ao governo brasileiro. Queria, assim, interromper a proibição
de manifestações populares, nas ruas e nas praças públicas, que a
chefia de Polícia federal vinha mantendo em quase todo o Brasil.
A Liga de Defesa Nacional, a União Nacional dos Estudantes, a Associação Brasileira de Imprensa e a Federação das Indústrias do Brasil tinham programado uma grande manifestação antinipônica e antifascista, no Rio, em frente à Embaixada Americana, mas a mesma foi proibida pela polícia.
Com uma nota à imprensa, essas entidades justificaram a suspensão das homenagens
levando
em consideração as palavras do Presidente Roosevelt, quando
proclamou o dia da traição de Pearl Harbor como o Dia da
Infâmia, impróprio a qualquer manifestação que envolva entusiasmo
cívico e só merecedor do esquecimento por parte dos que prezam a
dignidade humana, reafirmando, no entanto, seus sentimentos de
enérgica repulsa ao Eixo e de fraternal e incondicional
solidariedade ao governo e povo dos Estados Unidos. (fonte: jornal
Estado da Bahia [Agência Nacional], Salvador, Bahia, edição
de 06/12/43.)” (p. 198)
Capítulo
XVII – A oposição e a violência da ditadura – “Latente
no país desde a implantação do Estado Novo, o movimento de
oposição à ditadura ficou cindido depois da declaração de
guerra. Enquanto comunistas, antifascistas, grande parte do movimento
estudantil e quase a totalidade do movimento sindical e das classes
produtoras defendiam a política de união nacional contra o
nazi-fascismo sem Getúlio, tendo como foco principal parte do
movimento estudantil (Centro XI de Agosto) de São Paulo e das
correntes liberais e conservadoras daquele estado e de Minas Gerais,
Bahia, Rio Grande do Sul e outros.
“Esses setores da opinião pública nacional não haviam compreendido que a vitória dos aliados e o envio da Força Expedicionária Brasileira aos campos de batalha levariam seguramente ao fim do regime ditatorial.” (p. 201)
“Finalmente,
sai o Manifesto dos Mineiros, datado de 24 de outubro de 1943, para
marcar os ideais da Revolução de 1930; na verdade, o que faz é
defender toda uma ideologia da classe dominante, liberal externamente
e conservadora na essência:
Queremos alguma coisa além das franquias fundamentais, do direito de voto e do habeas-corpus. Nossas aspirações fundam-se no estabelecimento de garantias constitucionais, que se traduzam em efetiva segurança econômica e bem-estar para todos os brasileiros, não só das capitais, mas de todo o território nacional.
E conclui:
Se lutamos contra o fascismo, ao lado das Nações Unidas, para que a liberdade e a democracia sejam restituídas a todos os povos, certamente não pedimos demais reclamando para nós mesmos os direitos e as garantias que as caracterizam.
Assinam
o manifesto Adauto Lúcio Cardoso, Afonso Arinos de Mello Franco,
Afonso Pena Junior, Djalma Pinheiro Chagas, Mário Brandt, Milton
Campos, Virgílio de Mello Franco, Pedro Aleixo e muitos outros. A
sua publicação clandestina alcançou um enorme sucesso. Mas o
governo quer prender seus signatários e não tem força, pois todos
são pessoas de destaque (o contrário se dá com comunistas e
estudantes); assim, ele pressiona para prejudicar cada um
individualmente; os que trabalham em cargos oficiais são despedidos,
os outros perdem seus empregos.” (p. 203)
Mais
sobre o Manifesto dos Mineiros em
Capítulo
XVIII – Preparação da FEB – “A decisão do governo
brasileiro em enviar um corpo expedicionário à Europa foi muito
lenta. Embora o presidente Vargas tivesse assumido junto ao
presidente Roosevelt, no encontro de Natal, em janeiro de 1943, o
compromisso de o Brasil participar da guerra com um contingente de
tropas, ele foi boicotado pelo próprio governo.
Além
da resistência militar, de ordem interna, a essa importante decisão,
ocorria uma situação muito delicada, de ordem externa: o comando do
Exército dos EUA guardava algumas reservas sobre a conveniência da
participação do Exército brasileiro na guerra. As restrições ao
projeto militar do Brasil eram ainda mais fortes por parte do governo
britânico, que mantinha, a esse respeito, um posicionamento
abertamente contrário.
Mas
‘a pressão da sociedade brasileira foi muito forte, o que levou
Getúlio a transformar o envio da FEB numa espécie de pedra de toque
de seu Governo’ [fonte: William Waack, As duas faces da glória.
Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985, p. 27].
Para
encaminhar as negociações, em agosto de 1943, o presidente Vargas
decidiu mandar aos Estados Unidos, a convite deste país, o ministro
da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra, chefiando uma delegação
militar. Com essa viagem, Getúlio Vargas desejava atingir dois
objetivos. O primeiro, da mais alta relevância, seria dar um passo
seguro para a definição do magno problema relativo à organização
de uma força expedicionária, envolvendo e comprometendo
definitivamente seu vacilante ministro da Guerra. O segundo, de menor
importância, visava superar a crise interna que se esboçara no
final do mês de julho entre os generais Dutra e Manoel Rabello,
provocada pela contundente entrevista concedida por este à revista
Seiva, na qual criticava abertamente a condução do esforço de
guerra pelo ministro Eurico Dutra.” (pp. 211-12)
“A
designação do general João Batista Mascarenhas de Moraes para
organizar e instruir a 1ª Divisão de Infantaria do Exército
somente foi efetivada a 28 de novembro de 1943. A partir desta data,
acelerou-se o projeto de preparação da força expedicionária.”
(p. 213)
“Para
enfrentar as dificuldades de adaptação dos nossos soldados ao
modelo norte-americano, o Exército brasileiro enviou vários
oficiais a estágios nos EUA. E entre os primeiros encontravam-se os
generais Euclides Zenóbio da Costa, Canrobert Pereira da Costa,
Oswaldo Cordeiro de Farias e Falconiére da Cunha.
O
general Mascarenhas de Moraes foi também visitar as prováveis
frentes de combate onde deveriam atuar as forças brasileiras. Sua
comitiva partiu a 6 de dezembro de 1943 e fora integrada pelos
seguintes oficiais brasileiros e norte-americanos: major general J.G.
Ord e capitão Vernon Walters; general-de-brigada Anor Teixeira dos
Santos, coronel-aviador Vasco Seco, coronel médico Dr. Emanuel
Marques Porto, tenente-coronel I. E. Sebastião de Carvalho,
tenente-coronel Ademar de Queiroz, tenente-coronel-aviador Nelson
Wanderley, major Aguinaldo José Senna Pinheiro, major-aviador Rube
Canabarro, major-aviador Presse Bello e capitão Paulo Ferreira Pará.
Estiveram no Norte da África e na Itália, percorrendo nestes países
as frentes de combate e entrando em contato com os chefes militares
aliados daquele Teatro de Operações [fonte: Marechal J.B.
Mascarenhas de Moraes, A FEB pelo seu comandante. São Paulo,
Instituto Progresso Editorial S.A., 1947, p. 28].” (p. 214)
“A
FEB como projeto militar e político – No início de 1944, ao
contrário do que ocorrera quando foi declarada a guerra, em agosto
de 1942, as forças armadas brasileiras estavam seriamente empenhadas
na organização de um corpo expedicionário e queriam vê-lo na
Europa, ainda a tempo de participar da abertura da segunda frente. O
envio da FEB transformou-se, no final de 1943, num objetivo de
excepcional importância política para o governo do presidente
Vargas, em torno do qual havia total unanimidade, tanto no âmbito do
aparelho governamental como no da opinião pública. A influente
facção pró-germânica do governo já estava convencida de que a
vitória pendia para os aliados, sendo de grande interesse para o
Brasil a contribuição do Exército brasileiro para alcançá-la,
estando ela no comando. Somente a quinta-coluna persistia no seu
trabalho de espionagem e sabotagem ao esforço de guerra.
Os
primeiros dias do ano foram marcados por intensa movimentação
militar, no sentido de se visitar e conhecer o terreno onde a tropa
iria lutar.” (pp. 219-20)
“Como
EUA e Grã-Bretanha viam a FEB – Inicialmente, o governo dos EUA
não desejava a participação militar do Brasil na África ou na
Europa. Quando o presidente Vargas, em janeiro de 1943, durante o
encontro de Natal, externou ao presidente Roosevelt o propósito do
Brasil em contribuir com forças militares para o Teatro das
Operações, este não tomou a declaração ao pé da letra. Por
outro lado, Getúlio Vargas, ao proclamá-la, não o fazia com
sinceridade. Em janeiro de 1943, a guerra ainda não estava decidida
a favor das ações Unidas e tudo indicava que governo e Exército
jamais tomariam qualquer medida para a entrada do Brasil no conflito.
Mas,
em janeiro de 1944, o governo Vargas estava absolutamente empenhado
no envio de uma Força Expedicionária à Europa, e o governo
norte-americano o apoiava inteiramente, apesar das restrições dos
chefes de suas Forças Armadas. [...]
Com
a posição dos governos ditatoriais da Argentina e da Bolívia
fazendo uma coligação de clara tendência pró-Eixo, e com a
ascensão do presidente Farrel da Argentina e do ministro da Guerra
Juan Perón, o governo norte-americano chegou à conclusão de que
deveria enfrentar aquela coalização, fortalecendo as defesas
militares brasileiras na fronteira com o país platino.” (pp.
221-22)
Fonte:
FALCÃO, João. O Brasil e a 2ª Guerra. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1999.
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