Relações
do Papado com o
Nazismo – continuação 6
fonte:
CORNWELL,
John.
O
Papa
de
Hitler
– A
História
Secreta
de
Pio
XII.
(Hitler's
Pope:
the
secret
history
of
Pius
XII.
1999)
Trad.
A
.
B.
Pinheiro
de
Lemos.
Rio
de
Janeiro:
Imago
Ed.,
2000
Capítulo
16 – Pacelli e o Holocausto
“A
Solução Final evoluiu durante os três primeiros anos da guerra,
coincidindo com os três primeiros anos do pontificado de Pacelli.
Muito foi planejado e executado em sigilo, pois o regime nazista era
sensível, apavorado até, à opinião pública descontrolada. Mas
uma coisa tão ampla quanto um plano para destruir um povo inteiro
não podia permanecer oculta por muito tempo. Além disso, Adolf
Hitler deixara claro quais eram suas intenções para os judeus, em 3
de janeiro de 1939, quando declarou: 'Se o judaísmo internacional
tiver êxito, na Europa ou em qualquer outro lugar, em precipitar as
nações numa guerra internacional, o resultado não será a
bolchevização da Europa e a vitória dos judeus, mas sim o
extermínio da raça judia'. No final de julho de 1941, um mês
depois do ataque à Rússia, em 22 de junho de 1941, Reinhard
Heydrich recebeu ordens para efetuar todos os preparativos
necessários para 'uma solução completa' da questão judaica na
esfera de influência alemã na Europa. No outono de 1941, já
estavam em andamento os preparativos para uma operação gigantesca e
sem precedentes na História: a sistemática escravização,
deportação e extermínio de um povo inteiro.” (p. 313)
“A
'Solução Final' constituiu um teste sem precedentes da fé cristã,
uma religião baseada no conceito de ágape, o amor que
concede a cada pessoa, independente de qualquer diferença, o mesmo
respeito com filho de Deus – o amor que, como Pacelli declarou em
sua primeira encíclica de 1941, citando o pronunciamento de São
Paulo sobre a universidade cristã, não discrimina 'grego ou judeu,
circuncidado ou não-circuncidado, bárbaro ou cita, servo ou
liberto, pois Cristo está em tudo e em todos'. Os cristãos
defrontaram-se com um desafio moral histórico. Não era um dever
cristão óbvio protestar e resistir ao extermínio dos judeus,
quaisquer que fossem as consequências?
O
cristianismo, e o catolicismo em particular, tinha uma longa história
de antijudaísmo em termos religiosos, algo que não diminuíra no
século XX. Não era parte da cultura católica perseguir judeus com
base na ideologia racial hitlerista, muito menos justificar o
extermínio da raça. E, no entanto, à primeira vista, o catolicismo
parecia ter ligações com o nacionalismo de direita, o
corporativismo e o fascismo, que propunham o anti-semitismo ou
mantinham uma cumplicidade com o anti-semitismo em bases raciais.
Praticamente todos os ditadores de direita dessa época nasceram e
foram criados como católicos e especialmente Hitler, Horthy, Franco,
Pétain, Mussolini, Pavelic e Tiso (que era um padre católico).
Houve exemplos isolados mas significativos de bispos católicos
expressando opiniões anti-semitas, no momento mesmo em que a
perseguição aos judeus aumentava na Alemanha, em meados da década
de 1930. [...] ” (p. 315)
“Na
última semana deste mês, junho de 1942, a terrível situação dos
judeus na Europa nazista – um milhão dos quais já morrera a essa
altura – tornou-se do conhecimento do mundo inteiro, por meio dos
jornais e emissoras de rádio. O primeiro jornal a informar que os
judeus não estavam apenas sendo perseguidos, mas sim exterminados,
foi o Daily Telegraph, de Londres, que publicou
uma série de reportagens a respeito com o maior destaque. A
primeira, em 25 de junho, declarava: 'Mais de 700 mil judeus
poloneses foram assassinados pelos alemães, nos maiores massacres da
História do mundo'. A reportagem, baseada num despacho secreto de
Shmuel Zygilebojm, o representante judeu no Conselho Nacional
Polonês, alegava que os assassinatos estavam sendo cometidos com o
uso de gás venenoso. Zygillebojm mais tarde se suicidou, em
consequência do que achava ser a indiferença do Ocidente. Uma
segunda reportagem, publicada em 30 de junho, tinha o título
seguinte: 'MAIS DE UM MILHÃO DE JUDEUS MORTOS NA EUROPA'. Dizia que
o objetivo dos nazistas era 'exterminar a raça do continente
europeu'. As duas reportagens foram noticiadas pela BBC. Assim
chegaram ao conhecimento do papa, por meio de Osborne. O The
New York Times publicou as
reportagens a 30 de junho e 2 de julho, o que levou a um comício de
protesto no Madison Square Garden,
em Nova York, em 21 de julho. Mais ou menos nessa ocasião,
informações detalhadas sobre os campos de extermínio na Polônia
vazaram para o Ocidente, por intermédio de três fugitivos judeus;
seus relatos foram publicados por jornais americanos.” (pp. 318-19)
Segundo
fontes do Vaticano, que legitimam o silêncio, o papa recebeu
gradativamente as notícias 'estarrecedoras' das perseguições,
deportações e massacres contra os judeus, na França, na Holanda,
na Polônia, nos territórios do Leste, mas nada pôde fazer além de
preocupar-se e abater-se compungido. Temia que uma condenação em
público pudesse irritar ainda mais os líderes nazi-fascistas. Além
de tudo, Pacelli temia uma invasão da cidade de Roma – daí a
pressa do clero em desfazer-se de documentos comprometedores.
“Ao
longo do verão de 1942, cerca de 15 mil judeus holandeses foram
deportados para os campos de extermínio.” (p. 321)
“Até
124 de setembro de 1942, o número total de todos os judeus
deportados da Holanda era de 20.588, segundo os dados publicados por
Martin Gilbert.” (p. 323)
“No
final do ano [1942], cerca de 42 mil judeus haviam sido despachados
da França para Auschwitz. Como os documentos do Vaticano
comprovam, o núncio na França deu informações completas à
secretaria de Estado sobre cada estágio da deportação.” (p. 323)
Os
líderes norte-americanos queriam que a Santa Sé, na figura do Papa,
fizesse uma condenação explícita ('declaração clara e objetiva')
do massacre sistemático do povo judeu por ordens dos nazistas. Que o
Vaticano não temesse, pois os Aliados certamente venceriam a guerra
- tanto militarmente quanto moralmente. Na época da destruição
do Gueto de Varsóvia, com a deportação de seus habitantes, mesmo
com resistência, em julho de 1942, “os Aliados obtinham o sucesso
militar em vários teatros de guerra: a humilhação alemã em
Stalingrado, a notícia de El Alamein, os desembarques americanos na
África do Norte – mesmo assim, Pacelli continuou evasivo.” (p.
326)
A
Homilia da Véspera do Natal
“Em
24 de dezembro de 1942, depois de ter feito vários esboços, Pio XII
transmitiu pelo rádio sua homilia de Natal para o mundo. O tema foi
Direitos Humanos e os problemas do indivíduo em relação ao Estado.
Ele começou por asseverar que o desequilíbrio entre o Estado e o
indivíduo fora provocado pelas 'políticas econômicas perniciosas'
das últimas décadas, em que tudo se tornara 'subordinado ao motivo
de lucro'. Isto fizera com que o indivíduo fosse reduzido a ser um
mero instrumento de 'utilidade do Estado, com a exclusão de todas as
considerações éticas e religiosas'. Não havia nenhuma distinção
ou percepção no sentido sobre o contraste entre totalitarismo e
democracia, democracia social e comunismo, capitalismo e capitalismo
de bem-estar social. De sua visão geral papal, Pacelli declarava que
o mundo carecia da ordenação pacífica da sociedade oferecida pela
fidelidade à Santa Madre Igreja. Seu conceito de uma sociedade
ideal, no entanto, além de apelos à devoção individual e
familiar, era uma mistura de panaceias corporativistas e exortações
ao espírito 'cristão responsável'. A base de tudo era a premissa
da supremacia papal.” (pp. 327-28)
“Veio
em seguida a famosa declaração, que devia ser compreendida como um
repúdio claro ao extermínio do povo judeu pelos nazistas, como ele
mais tarde alegou: 'A humanidade deve
esse voto às centenas
de milhares de pessoas
que, sem qualquer culpa
pessoal, às vezes apenas
por causa de sua
nacionalidade ou raça,
estão marcadas para a
morte ou extinção
gradativa.'
Era
o ponto máximo a que iria seu protesto e denúncia, depois de um ano
de encorajamento, súplica, argumentação, prova depois de prova do
que acontecia na Polônia e em toda a Europa. Haveria de permanecer
como o máximo de seu protesto e denúncia pelo resto da guerra.
Não
era apenas uma declaração insignificante. O abismo entre a
enormidade do extermínio do povo judeu e essa forma de palavras
evasivas é chocante. […] Não mencionara em parte alguma nazista
ou Alemanha nazista. O próprio Hitler não poderia desejar uma
reação mais enrolada e inócua do vigário de Cristo ao maior crime
da história humana.” (pp. 328-29)
fonte:
CORNWELL,
John.
O
Papa
de
Hitler
– A
História
Secreta
de
Pio
XII.
(Hitler's
Pope:
the
secret
history
of
Pius
XII.
1999)
Trad.
A
.
B.
Pinheiro
de
Lemos.
Rio
de
Janeiro:
Imago
Ed.,
2000
Seleção
/ comentários : LdeM
mais
info
a
imprensa britânica e o Holocausto
trecho:
“Some reports of a
systematic policy to
exterminate Jews were
published in newspapers. On
25 June 1942 the
Daily
Telegraph reported
that 700,000 Polish Jews
had been killed, some
by mobile gas chambers.
Most newspapers by the
end of June were
writing of more than
a million dead, and
Hitler's plan to
exterminate all Jews.”
(trad. LdeM : 'Algumas notícias de uma política sistemática para
exterminar os judeus foram publicadas em jornais. Em 25 de junho de
1942 o Daily Telegraph noticiou que 700.000
judeus poloneses foram mortos, alguns em câmeras de gás móveis
[i.e. caminhões adaptados]. Muitos jornais ao fim de junho relatavam
mais de um milhão de mortos, e o plano de Hitler para exterminar
todos os judeus.”)
Timeline
do Holocausto
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